Questão 2 Comentada - Tribunal Regional do Trabalho - Analista Judiciário - Área Administrativa (2022)

Melancolia e criatividade


Desde sempre o sentimento da melancolia gozou de má fama. O melancólico é costumeiramente tomado como um ser desanimado, depressivo, “pra baixo”, em suma: um chato que convém evitar. Mas é uma fama injusta: há grandes melancólicos que fazem grande arte com sua melancolia, e assim preenchem a vida da gente, como uma espécie de contrabando da tristeza que a arte transforma em beleza. “Pra fazer um samba com beleza é preciso um bocado de tristeza”, já defendeu o poeta Vinícius de Moraes, na letra de um conhecido samba seu.

Mas a melancolia não para nos sambas: ela desde sempre anima a literatura, a música, a pintura, o cinema, as artes todas. Anima, sim: tanto anima que a gente gosta de voltar a ver um bom filme melancólico, revisitar um belo poema desesperançado, ouvir uma vez mais um inspirado noturno para piano. Ou seja: os artistas melancólicos fazem de sua melancolia a matéria-prima de uma obra-prima. Sorte deles, nossa e da própria melancolia, que é assim resgatada do escuro do inferno para a nitidez da forma artística bem iluminada.

Confira: seria possível haver uma história da arte que deixasse de falar das grandes obras melancólicas? Por certo se perderia a parte melhor do nosso humanismo criativo, que sabe fazer de uma dor um objeto aberto ao nosso reconhecimento prazeroso. Charles Chaplin, ao conceber Carlitos, dotou essa figura humana inesquecível da complexa composição de fracasso, melancolia, riso, esperteza e esperança. O vagabundo sem destino, que vive a apanhar da vida, ganhou de seu criador o condão de emocionar o mundo não com feitos gloriosos, mas com a resistente poesia que o faz enfrentar a vida munido da força interior de um melancólico disposto a trilhar com determinação seu caminho, ainda que no rumo a um horizonte incerto.


(Humberto Couto Villares, a publicar)



Afirma-se no segundo parágrafo do texto que a negatividade da melancolia

  • A anima de preferência os gêneros artísticos mais efusivos, como aqueles sambas que tematizam sua própria tristeza.
  • B alcança um valor social positivo quando os artistas a expressam por meio de uma forma bela que a ilumina e a propaga entre nós.
  • C faz com que tenhamos que repetir o acesso a uma mesma obra de arte para nos darmos conta de sua sombria complexidade.
  • D impede que se promova entre nós a falsidade das alegrias artificiais, que pretendem nos resgatar das nossas tristezas mais fundas.
  • E favorece o artista que se esmera em mergulhar nas profundezas dos maus sentimentos para assim disseminá-los entre nós.