Questão 1 Comentada - Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPE-RJ) - Defensor Público - FGV (2021)

Em 2003, Francisco adquiriu de Pedro lote de terreno de 330 m2 , em área urbana, através de contrato particular de compra e venda, contrato esse não levado a registro. No contrato estava previsto o pagamento de 30 parcelas de R$ 300,00. Francisco reside no local desde 2003 e não possui qualquer outro imóvel urbano ou rural. Em janeiro de 2021, Francisco procura o(a) Defensor(a) Público(a) da Comarca em que reside para regularizar a situação imobiliária do imóvel. O(A) Defensor(a) Público(a), ao analisar a documentação, verifica o seguinte: a parte apresentou comprovante de pagamento de todas as parcelas, o contrato não está assinado por Pedro e o lote em questão não é registrado no Registro de Imóveis competente.
O(A) Defensor(a) Público(a) deverá:

  • A ajuizar ação de usucapião ordinário;
  • B ajuizar ação de adjudicação compulsória;
  • C ajuizar ação de usucapião constitucional urbano;
  • D informar que não é possível o ajuizamento de qualquer demanda, oficiando para a Corregedoria-Geral da Defensoria Pública;
  • E encaminhar as partes para o cartório do Registro Geral de Imóveis (RGI) competente para lavratura de escritura de usucapião extrajudicial.

Gabarito comentado da Questão 1 - Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPE-RJ) - Defensor Público - FGV (2021)

A) Correta.

- A usucapião ordinária está prevista no caput do art. 1.242 do CC, veja: “Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos”.

- Conforme se extrai do dispositivo, tal modalidade possui os seguintes requisitos:

I) Prazo prescricional de 10 anos; e

II) Ser o possuidor portador de justo título e boa-fé.

- O enunciado deixou claro que Francisco adquiriu, através de contrato particular de compra e venda (justo título e boa-fé), um imóvel, bem como o fato de que ele lá reside desde 2003 (como procurou o defensor público em janeiro de 2021, mais de 10 anos de posse mansa e pacífica transcorreram).

- Todos os requisitos, portanto, estão preenchidos.


B) Incorreta.

- Não caberá adjudicação compulsória pelo fato de que o enunciado foi claro ao consignar que o negócio fora feito “através de contrato particular de compra e venda, contrato esse não levado a registro”.

- Veja o que dispõe os arts. 1.417 e 1.418 do CC:

Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.

Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.


C) Incorreta.

- Não cabe usucapião constitucional urbano, uma vez que o enunciado foi claro em dizer que a metragem do lote é de “330 m²”.

- Veja o que dispõe o art. 183 da CF/88:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.


D) Incorreta.

- Conforme já visto, é perfeitamente cabível a usucapião ordinária.


E) Incorreta.

- Não há se falar em usucapião extrajudicial.

- De um lado porque uma das exigências é a representação por advogado ou defensor público e a assertiva apenas disse “encaminhar” as partes para o cartório, não acompanhar.

- Noutro rumo pelo fato de que a questão deixou claro que o imóvel em questão não possui registro no cartório de imóveis, coisa que a lei exige.

Lei 6.015/73, art. 216-A. Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado, instruído com:

I - ata notarial lavrada pelo tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e de seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias, aplicando-se o disposto no art. 384 da Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil);

II - planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de anotação de responsabilidade técnica no respectivo conselho de fiscalização profissional, e pelos titulares de direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes;

III - certidões negativas dos distribuidores da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente;

IV - justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse, tais como o pagamento dos impostos e das taxas que incidirem sobre o imóvel.