Resumo de Direito do Consumidor - Proteção do consumidor nos contratos de financiamento

Proteção Contratual do Consumidor

Os arts. 52 e 53 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) dispõem sobre as regras de financiamento de bens que visam proteger o consumidor.


Contrato de outorga de crédito ou concessão de financiamento

De acordo com o art. 52 do CDC, no fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento, o consumidor deve ser prévia e adequadamente informado pelo fornecedor sobre:

a) o preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;

b) montante dos juros de mora e de taxa efetiva anual de juros;

c) acréscimos legalmente previstos;

d) soma total a pagar, com e sem financiamento.

Nos termos do art. 52, § 1º, CDC, as multas de mora decorrentes de inadimplemento de obrigação pelo consumidor não poderão ser superiores a 2% do valor da prestação.

Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o percentual de multa de mora deve ser calculado sobre o valor das prestações vencidas e não sobre o total do financiamento.

Além disso, o art. 52, § 2º, CDC, estipula o direito do consumidor liquidar antecipadamente o débito financiado, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos.


Contrato de compra e venda a prestação de bens móveis ou imóveis e alienação fiduciária em garantia

De acordo com o art. 53 do CDC, “nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado”.

O CDC considera nula de pleno direito a cláusula que estabeleça a perda total das prestações pagas em benefício do credor, vedando, assim, o enriquecimento ilícito sem causa.

A doutrina denomina de cláusula de decaimento ou de perdimento a cláusula que estabelece a perda total das prestações pagas pelo consumidor no contrato de:

a) compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações;

b) alienações fiduciárias em garantia.

No entanto, para que o consumidor também não se enriqueça ilicitamente, é admitida cláusula que estabeleça retenção parcial das parcelas pagas, tendo em vista as despesas administrativas assumidas pelo fornecedor para celebração do negócio.

A Súmula nº 543 do STJ estabelece que “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento”.


Contrato de consórcio de produtos duráveis

Conforme o art. 53, § 2º, do CDC, o consorciado desistente ou inadimplente terá o direito a ser restituído das parcelas quitadas, mas será descontado desse valor a vantagem econômica auferida com a fruição, bem como os prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao grupo, evitando, assim, o enriquecimento ilícito de qualquer das partes.


Superendividamento

Prosseguindo nos estudos, cabe-nos aprofundar a análise do tema proteção contratual e fazer algumas considerações sobre os casos de (super)endividamento do consumidor.

Nesse esteio, o endividamento é um fenômeno natural das sociedades de consumo, eis que, não obstante a classe social, é corriqueiro que o consumidor possua débitos para serem adimplidos (ainda que pequenos) no cartão de crédito, em lojas de departamentos, em financeiras de carros, bancos etc.

O capitalismo busca fomentar que as pessoas adquiram, cada vez mais, itens de consumo, inclusive facilitando o acesso ao crédito para esse desiderato.

O consumo e o crédito, portanto, possuem ligação intrínseca: para consumir muitas vezes necessita-se de crédito, se há crédito ao consumo, a produção aumenta e a economia se aquece, aumentando o emprego e movimentando o mercado de consumo.

Contudo, os perigos do crédito podem ser atuais ou futuros. Atuais, pois o crédito fornece ao consumidor a impressão de que – mesmo com orçamento reduzido – tudo pode adquirir.

Embebido das várias tentações da sociedade de consumo, multiplica suas compras até que não lhe seja mais possível pagar em dia o conjunto de suas dívidas em um tempo razoável.

No direito comparado, afirma-se que, quem já comprometeu mais de 50% (cinquenta por cento) de sua possibilidade atual e futura de pagamento (retirando os gastos mensais regulares básicos) está superendividado.

O superendividamento pode ser definido com a impossibilidade global do devedor-pessoa física, consumidor, leigo e de boa-fé, de pagar todas suas dívidas atuais e futuras (excluídas as dívidas com o Fisco, oriundas de delitos e de alimentos) em um tempo razoável com sua capacidade atual de rendas e patrimônio.

A doutrina divide o superendividamento em:

a) superendividamento ativo – aquele em que o consumidor abusa do crédito que lhe foi concedido e consome demasiadamente acima das possibilidades de seu orçamento.

Divide-se em:

a.1) superendividamento ativo consciente – aquele em que o consumidor, de má-fé, contrai dívidas ciente de que não poderá pagá-las, com a intenção deliberada de fraudar credores;

a.2) superendividamento ativo inconsciente – ocorre quando o consumidor age impulsivamente, sem qualquer malícia, deixando de fiscalizar seus gastos e a evolução de seus débitos;

b) superendividamento passivo – aquele em que o consumidor não contribuiu decisiva e voluntariamente para o aparecimento da crise de solvência e liquidez. O consumidor, embora de boa-fé, vê-se em uma situação de perene insolvência em razão de atos inesperados ou acidentes da vida (divórcio, doença, acidentes, desemprego etc.).

Muito embora não haja legislação específica para proteção aos casos de superendividamento, especialmente para os casos em que for aquilatada a boa-fé do consumidor, o ordenamento pátrio possui uma (parcial) proteção normativa, que decorre da cláusula geral da dignidade da pessoa humana (Constituição Federal de 1988 – CF/1988, art. 1º, III), da aplicação dos princípios da boa-fé, da transparência (CDC, art. 4º), do equilíbrio contratual (CDC, art. 6º, V) e da função social dos contratos (Código Civil – CC, art. 421).

Nesse diapasão, avulta-se a importância da possibilidade de modificação e revisão das cláusulas contratuais (CDC, art. 6º, V), da análise e controle da publicidade (CDC, art. 36) e da aferição de eventuais cláusulas abusivas (CDC, art. 51).

Por conseguinte, sempre que se constatar uma situação involuntária de superendividamento do consumidor (tanto no superendividamento passivo, como no ativo inconsciente), como consectário maior da dignidade humana e do mínimo existencial, devem ser aplicados princípios e regras do ordenamento jurídico para salvaguardar os interesses do consumidor e buscar, sempre que possível, possibilitar a reorganização de suas finanças e seu retorno ao mercado de consumo.