Resumo de Direito do Consumidor - Práticas abusivas

Práticas Abusivas

São práticas abusivas as que excedem os limites dos bons costumes comerciais e, principalmente, da boa-fé, pelo que caracterizam abuso de direito, considerado ilícito pelo art. 187 do Código Civil (CC), de forma a ensejar descompasso com o padrão comportamental de lealdade e confiança esperado das partes nas relações de consumo.

Para configurar a prática abusiva, não é necessário que o consumidor tenha sofrido lesão em direito individual, bastando que seja demonstrada a potencialidade ofensiva de tal prática que incluem as regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC).


Hipóteses de práticas abusivas

Muito importante!

O CDC, no art. 39, elenca, exemplificativamente, o rol de práticas consideradas abusivas.

Tais condutas abusivas manifestam-se por meio de uma série de atividades, pré e pós-contratuais, contra as quais o consumidor não tem defesas, dada a sua vulnerabilidade.

O CDC, ao proibir a prática das condutas abusivas, impõe ao fornecedor o dever de atuação em conformidade com a norma, cujo descumprimento pode ser sancionado civil, administrativa e criminalmente.

Seguem as hipóteses legais:

I. Venda casada e limitação quantitativa sem justa causa: A venda casada consistente no condicionamento de fornecimento do produto ou serviço ao fornecimento de outro ou a limites quantitativos injustificados.

Ela é identificada quando o fornecedor impõe a venda conjunta de produtos ou serviços que normalmente são adquiridos ou contratados de forma separada.

Por exemplo, já se considerou venda casada na hipótese em que o banco condiciona o empréstimo à contratação de seguro de vida. Ou ainda, quando a rede de cinema permitir apenas o consumo de alimentos adquiridos no próprio cinema.

Além disso, já se considerou venda casada impor ao mutuário do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) a contratação do seguro habitacional diretamente com o agente financeiro ou por seguradora indicada por este (Súmula nº 473 do Superior Tribunal de Justiça – STJ).

No entanto, não se considera venda casada se a venda em separado dos produtos for desfavorável ao fornecedor, uma vez que o produto remanescente dificilmente seria vendido de forma avulsa. Por exemplo, a venda em separado da fronha e do lençol.

Na limitação quantitativa sem justa causa, é proibido também condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, sem justa causa, a limites quantitativos.

Assim, o fornecedor não pode exigir que o consumidor adquira produtos em maior quantidade que este efetivamente necessite. Por exemplo, se o fornecedor faz oferta de aquisição de três frascos de detergente, não pode exigir que o consumidor compre os três frascos. Nesse caso, o consumidor pode adquirir um ou dois, abrindo mão do preço promocional.

Veja-se que só há prática abusiva, se ausente justa causa.

Entre outras causas, considera-se presente a justa causa:

a) Em razão da natureza do produto, a venda fique economicamente inviável. Exemplo: venda de um palito de fósforo.

b) Em razão do ramo de comércio. Exemplo: aquisição de produtos em atacadistas.

c) Limitação do estoque visando o interesse dos demais consumidores.

II. Recusa no atendimento à demanda do consumidor: é vedado ao fornecedor recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes.

O fornecedor não pode fazer distinção entre consumidores ou ainda o vendedor não pode recusar-se a vender um produto que ele possua no estoque.

Por exemplo, um taxista não pode se recusar a fazer uma corrida, porque a distância é curta.

III. Envio de produto fornecimento de serviço sem solicitação prévia: é defeso ao fornecedor enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço.

O produto enviado ao consumidor sem que este tenha pedido é considerado amostra grátis, não sendo exigido do consumidor a contraprestação.

IV. Prevalecimento da fraqueza ou ignorância do consumidor: é proibido que o fornecedor se aproveite da fraqueza ou ignorância do consumidor, como idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços.

Por exemplo, hospital exigir do consumidor debilitado em termos de saúde o cheque caução.

V. Exigência de vantagem manifestamente excessiva: é vedado ao consumidor exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva, o que se apura no caso concreto.

Considera-se vantagem manifestamente excessiva aquela que:

a) ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

b) restringe direitos ou obrigações fundamentais, inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual;

c) se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

VI. Execução de serviço sem orçamento prévio e autorização expressa: é vedado ao fornecedor executar serviço sem prévios orçamento e autorização expressa do consumidor.

Se entre as partes é costume a realização de serviço sem orçamento, não há a prática abusiva.

A forma que deve constar do orçamento está descrita no art. 40 do CDC:

Art. 40. O fornecedor de serviço será obrigado a entregar ao consumidor orçamento prévio discriminando o valor da mão de obra, dos materiais e equipamentos a serem empregados, as condições de pagamento, bem como as datas de início e término dos serviços.

§ 1º Salvo estipulação em contrário, o valor orçado terá validade pelo prazo de dez dias, contado de seu recebimento pelo consumidor.

§ 2º Uma vez aprovado pelo consumidor, o orçamento obriga os contraentes e somente pode ser alterado mediante livre negociação das partes.

§ 3º O consumidor não responde por quaisquer ônus ou acréscimos decorrentes da contratação de serviços de terceiros não previstos no orçamento prévio.

VII. Repasse de informação depreciativa: é vedado ao fornecedor repassar informação depreciativa a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos.

Não se configura prática abusiva a negativação do nome do consumidor nos serviços de proteção ao crédito, pois tal prática é permitida pelo art. 43 do CDC.

VIII. Não observância das normas técnicas: é vedado ao fornecedor colocar no mercado de consumo qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro).

IX. Recusa de venda de bens ou prestação de serviços mediante pronto pagamento: é vedado ao fornecedor recusar a venda de bens ou prestação de serviço diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais.

O pagamento por meio de cheque pode ser recusado pelo fornecedor, desde que haja informação expressa e clara nesse sentido.

X. Elevação do preço sem justificativa: o fornecedor é livre para fixar os preços do produto ou serviço, mas não pode haver elevação do preço sem justa causa.

XI - Dispositivo incluído pela MPV nº 1.890-67, de 22.10.1999, transformado em inciso XIII, quando da conversão na Lei nº 9.870, de 23.11.1999

XII. Ausência ou discricionariedade na determinação de prazo para cumprimento da obrigação.

XIII. Aplicação de reajuste diversos do legal ou contratual.

XIV. Permissão em estabelecimentos de um número maior de consumidores que o fixado pela autoridade administrativa.


Práticas abusivas em planos de saúde

A título de aprofundamento, vejamos, algumas questões relacionadas a possíveis práticas abusivas relacionadas aos planos de saúde, especialmente por que se trata de assunto de grande incidência nas provas.

Vale conferir, dessa forma, alguns importantes posicionamentos do STJ:

a) “É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado” (Súmula nº 302).

b) “O serviço de ‘home care’ (tratamento domiciliar) constitui desdobramento do tratamento hospitalar contratualmente previsto que não pode ser limitado pela operadora do plano de saúde” (REsp. nº 1.378.707/RJ).

c) “Tratando-se de internação de emergência, a recusa da operadora do plano de saúde de emitir autorização para a realização do procedimento, sob o fundamento de que não foi observado o prazo de carência, se mostra abusiva, devendo, por conseguinte ser afastada pelo Poder Judiciário” (REsp. nº 1.348.146/DF).

d) “A seguradora não poderia ter adotado uma postura passiva, de simplesmente aceitar as negativas do segurado quanto à existência de problemas de saúde, depois se valendo disso para negar-lhe cobertura” (REsp. nº 1.230.233/MG).

De mais a mais, vale mencionar que, a despeito da grande divergência ainda incidente sobre o tema, o STJ, alterando posição anterior, aceitou que o aumento da idade do segurado implica a necessidade de maior assistência médica e, por isso, pode haver reajuste de mensalidade de plano ou seguro de saúde em razão da mudança de faixa etária, na forma da Lei nº 9.656/1998, sem que isso afronte o disposto no art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso (REsp. nº 1.381.606/DF – recurso repetitivo).

No precedente mencionado, o Tribunal da Cidadania firmou a tese (tema/repetitivo nº 952) de que o reajuste de mensalidade de plano de saúde individual ou familiar fundado na mudança de faixa etária do beneficiário é válido desde que:

a) haja previsão contratual;

b) sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos governamentais reguladores; e

c) não sejam aplicados percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso.


Da cobrança de dívidas

Constitui exercício regular de direito a prática do fornecedor de cobrar uma dívida do consumidor inadimplente.

Muito importante!

A prática vedada pelo CDC, expressa no art. 42, é a cobrança abusiva, ou seja, a cobrança que expõe o consumidor inadimplente ao ridículo ou o submete a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça, que deve ser analisado no caso concreto.

A cobrança abusiva é aquela em que, além de outras formas, há a presença de:

a) ameaça;

b) coação;

c) constrangimento físico ou moral;

d) afirmações falsas, incorretas ou enganosas;

e) qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer.

Cabe ressaltar que o consumidor tem o direito de repetição de débito em dobro, caso receba cobrança extrajudicial indevida, sem engano justificável, desde que o consumidor faça efetivamente o pagamento decorrente dessa cobrança indevida.