Questão 41 Comentada - Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPE-RJ) - Defensor Público - FGV (2023)

Jhuly, travesti, vive em união estável com Pedro, que foi preso, em razão de mandado de prisão preventiva, acusado do crime de tráfico de drogas (Art. 33, Lei federal nº 11.343/2006). Jhuly passou a realizar visitas periódicas a Pedro na unidade prisional. Em uma das visitas, Pedro solicitou que Jhuly lhe trouxesse 20g de maconha. Em 10/03/2023, Jhuly tentou adentrar a unidade prisional com o material entorpecente solicitado por Pedro, mas foi flagrada pelo bodyscan. Autuado o flagrante em face de Jhuly e Pedro, ambos foram encaminhados à audiência de custódia em 13/03/2023.

Diante dessa situação-problema, é correto afirmar, nos termos da legislação vigente, que:

  • A se decretada a prisão preventiva de Jhuly, esta deverá cumpri-la em estabelecimento prisional masculino, sem direito de opção pela custódia em área reservada ou em unidade feminina, pois medida cautelar deferida pelo Supremo Tribunal Federal em Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) não reconheceu o direito à identificação de gênero para pessoas travestis, apenas para mulheres transgêneros. Deverá ser relaxada a prisão de Pedro, pois a ação de solicitar não se encontra entre os elementos essenciais do tipo do Art. 33 da Lei federal nº 11.343/2006, podendo configurar, no máximo, atos preparatórios;
  • B não cumprido o prazo de 24 horas para a realização da audiência de custódia, deve a prisão em flagrante ser relaxada, acarretando automática nulidade no processo penal, e eventual representação pela prisão preventiva não constitui novo título a justificar a privação da liberdade. Além disso, deve, ainda, ser relaxada a prisão de Pedro, pois a ação de solicitar não se encontra entre os elementos essenciais do tipo do Art. 33 da Lei federal nº 11.343/2006, podendo configurar, no máximo, atos preparatórios;
  • C deverá ser relaxada a prisão de Pedro, pois a ação de solicitar não se encontra entre os elementos essenciais do tipo do Art. 33 da Lei federal nº 11.343/2006, podendo configurar, no máximo, atos preparatórios. Se decretada a prisão preventiva de Jhuly, esta deverá cumpri-la em estabelecimento prisional masculino, com direito de opção pela custódia em área reservada ou em unidade feminina, em razão de medida cautelar deferida pelo Supremo Tribunal Federal em Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), que reconheceu o direito à identificação de gênero para travestis e mulheres transgêneros;
  • D o não cumprimento do prazo de 24 horas para a realização da audiência de custódia não acarreta automática nulidade no processo penal, e eventual representação pela prisão preventiva, constitui novo título a justificar a privação da liberdade. Se decretada a prisão preventiva de Jhuly, esta deverá cumpri-la em estabelecimento prisional masculino, sem direito de opção pela custódia em área reservada ou em unidade feminina, pois medida cautelar deferida pelo Supremo Tribunal Federal em Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) não reconheceu o direito à identificação de gênero para pessoas travestis, apenas para mulheres transgêneros;
  • E não deverá ser relaxada a prisão de Pedro, pois a ação de solicitar, no contexto fático apresentado, se trata de autoria mediata do crime capitulado no Art. 33 da Lei federal nº 11.343/2006. Além disso, o não cumprimento do prazo de 24 horas para a realização da audiência de custódia não acarreta automática nulidade no processo penal, e eventual representação pela prisão preventiva constitui novo título a justificar a privação da liberdade.

Gabarito comentado da Questão 41 - Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPE-RJ) - Defensor Público - FGV (2023)

Em junho de 2019 foi proferida medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 527, por meio do qual se determinou que presas transexuais e travestis com identidade de gênero feminino possam optar por cumprir penas em estabelecimento prisional feminino ou masculino.

Há de se atentar, todavia, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou a tramitação da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 527, em que a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ALGBT) buscava assegurar o direito de transexuais femininas e travestis ao cumprimento de pena em condições compatíveis com a sua identidade de gênero.

Prevaleceu o entendimento de que a questão já foi regulamentada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), preservando os direitos do grupo minoritário. De fato, atualmente, o tema é tratado pela Res. 348/2020 do CNJ, que estabelece:

Art. 7º Em caso de prisão da pessoa autodeclarada parte da população LGBTI, o local de privação de liberdade será definido pelo magistrado em decisão fundamentada.

§ 1º A decisão que determinar o local de privação de liberdade será proferida após questionamento da preferência da pessoa presa, nos termos do art. 8º, o qual poderá se dar em qualquer momento do processo penal ou execução da pena, assegurada, ainda, a possibilidade de alteração do local, em atenção aos objetivos previstos no art. 2º desta Resolução. […]

Art. 8º De modo a possibilitar a aplicação do artigo 7º, o magistrado deverá:

I – esclarecer em linguagem acessível acerca da estrutura dos estabelecimentos prisionais disponíveis na respectiva localidade, da localização de unidades masculina e feminina, da existência de alas ou celas específicas para a população LGBTI, bem como dos reflexos dessa escolha na convivência e no exercício de direitos;

II – indagar à pessoa autodeclarada parte da população transexual acercada preferência pela custódia em unidade feminina, masculina ou específica, se houver, e, na unidade escolhida, preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas, onde houver; e

III – indagar à pessoa autodeclarada parte da população gay, lésbica, bissexual, intersexo e travesti acerca da preferência pela custódia no convívio geral ou em alas ou celas específicas”.

De outro lado, deverá ser relaxada a prisão de Pedro, pois a ação de solicitar não se encontra entre os elementos essenciais do tipo do Art. 33 da Lei federal n° 11.343/2006, podendo configurar no máximo. atos preparatórios.

Por fim, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que “a não realização de audiência de custódia no prazo de 24 horas não acarreta a automática nulidade do processo criminal, assim como que a conversão do flagrante em prisão preventiva constitui novo título a justificar a privação da liberdade, ficando superada a alegação de nulidade decorrente da ausência de apresentação do preso ao Juízo de origem.” (RHC n. 119.091/MG, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, DJe 12/12/2019).