Questão 4 Comentada - Ministério das Relações Exteriores (MRE) - Oficial de Chancelaria - CESPE/CEBRASPE (2023)

Texto 1A1-I


           Machado de Assis viria a sofrer, no governo do presidente Prudente de Morais, o que considerou uma grave injustiça. Julgando lhe ser agradável e querendo deixar-lhe mais tempo livre para seus trabalhos literários, o novo ministro, Sebastião Eurico Gonçalves de Lacerda — pai do grande tribuno parlamentar Maurício de Lacerda e avô de Carlos Lacerda — resolveu substituir Machado de Assis na Diretoria de Viação, que então ocupava, deixando-o como simples adido à Secretaria de Estado, percebendo os vencimentos que lhe competissem. Machado ficou muito magoado, achando que o ministro o julgara um inútil. Queixou-se muito, em cartas aos amigos, não se conformando em ficar de braços cruzados, ganhando o dinheiro da nação sem trabalhar. Foi durante esse período que escreveu uma de suas obras-primas, Dom Casmurro; sempre demonstrara, em seus romances, contos e crônicas, profunda aversão aos parasitas. E era sincero. Não queria ser um deles. E não sossegou enquanto não voltou à atividade, embora diminuído funcionalmente: de diretor de um departamento, passou a ser simples secretário do ministro Severino Vieira. Quando este se demitiu, no governo de Campos Sales, para candidatar-se ao governo da Bahia, o ministro da justiça, Epitácio Pessoa, nomeado para substituir interinamente Severino Vieira, não se deu bem com Machado de Assis. Jovem, irrequieto, Epitácio estava então veraneando em Petrópolis. Pela manhã, atendia ao expediente da pasta da justiça. À tarde, ia para o outro ministério, onde Machado de Assis lhe fazia minuciosas exposições sobre cada assunto, apresentando-lhe em seguida as minutas dos despachos. Epitácio queria sempre abreviar as exposições, a fim de não perder a barca que saía da Prainha para Mauá, no fundo da baía, de onde, nos fins do século XIX, partia o trem para Petrópolis. Algumas vezes perdeu a barca, só tomando a segunda e chegando à casa já em plena noite. Por isso, um dia disse a respeito de Machado: “Grande escritor, mas péssimo secretário!”. Talvez Machado, sem o dizer, pensasse a mesma coisa de Epitácio: “Moço inteligente, mas muito afobado para ser um bom ministro!”.

        Machado passou vários anos constrangido e humilhado até encontrar, em Lauro Müller — o grande ministro da viação que iniciou as obras do Porto do Rio de Janeiro e fez construir a Avenida Central, hoje Avenida Rio Branco — quem lhe fizesse justiça. Lauro Müller fez Machado voltar a ser diretor.


Raymundo Magalhães Jr. Machado de Assis funcionário público. In: Revista do Serviço Público, Brasília, 56(2), abr. – jun./2005, p. 237-248 (com adaptações). 


A respeito do emprego da vírgula no primeiro período do texto 1A1-I, assinale a opção correta.

  • A A vírgula após “sofrer” é dispensável, visto que o termo adverbial “no governo (...) Morais” está posicionado ao final da oração principal.
  • B O trecho “no governo (...) Morais” está isolado entre vírgulas por consistir em um termo com função adverbial intercalado no período.
  • C A inserção de uma vírgula após “presidente” implicaria ênfase ao nome “Prudente de Morais”, sem modificar as relações sintáticas do período.
  • D O emprego da vírgula após “Morais” tem a finalidade de demarcar o início de uma oração explicativa.
  • E As vírgulas sinalizam uma sequência enumerativa de termos no período em questão.

Gabarito comentado da Questão 4 - Ministério das Relações Exteriores (MRE) - Oficial de Chancelaria - CESPE/CEBRASPE (2023)

Vamos analisar a questão sobre a frase "Machado de Assis viria a sofrer, no governo do presidente Prudente de Morais, o que considerou uma grave injustiça." e o emprego correto das vírgulas.

A) INCORRETA. “no governo do presidente Prudente de Morais" é um adjunto adverbial de tempo, indicando a circunstância em que a ação de sofrer ocorreu. Como está deslocado da ordem direta (sujeito - verbo - complemento), deve ser isolado por vírgulas. A afirmação está correta quanto à função do adjunto adverbial e à necessidade de vírgulas, mas o erro está na avaliação geral da frase.

B) CORRETA. O trecho "no governo do presidente Prudente de Morais" exerce função adverbial, indicando tempo, e está intercalado na oração principal. Adjuntos adverbiais deslocados da sua posição original (após o verbo, em geral) precisam ser isolados por vírgulas. Esta alternativa identifica corretamente a função sintática e a regra de pontuação.

C) INCORRETA. A vírgula não alteraria a função sintática para aposto explicativo. O trecho continua a ser um adjunto adverbial, mesmo com as vírgulas. O aposto explicativo teria outra função e estrutura, geralmente relacionada a uma explicação sobre o termo anterior.

D) INCORRETA. A vírgula após “Morais" não é justificada sozinha. A necessidade de vírgulas é para isolar todo o trecho adverbial, tanto antes quanto depois dele, para marcar a sua interrupção na sequência da frase.

E) INCORRETA. Não há enumeração na frase. As vírgulas servem para isolar o adjunto adverbial, que está intercalado na oração.