Questão 1 Comentada - Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE-CE) - Analista de Controle Externo - Auditoria de Obras Públicas - FCC (2015)

Eduardo Coutinho, artista generoso


      Uma das coisas mais bonitas e importantes da arte do cineasta Eduardo Coutinho, mestre dos documentários, morto em 2014, está em sua recusa aos paradigmas que atropelam nossa visão de mundo. Em vez de contemplar a distância grupos, classes ou segmentos, ele vê de perto pessoa por pessoa, surpreendendo-a, surpreendendo-se, surpreendendo-nos. Não lhe dizem nada expressões coletivistas como “os moradores do Edifício”, os “peões de fábrica”, “os sertanejos nordestinos”: os famigerados “tipos sociais”, usualmente enquadrados por chavões, dão lugar ao desafio de tomar o depoimento vivo de quem ocupa aquela quitinete, de investigar a fisionomia desse operário que está falando, de repercutir as palavras e os silêncios do morador de um povoado da Paraíba.

      Essa dimensão ética de discernimento e respeito pela condição singular do outro deveria ser o primeiro passo de toda política. Nem paternalismo, nem admiração prévia, nem sentimentalismo: Coutinho vê e ouve, sabendo ver e ouvir, para conhecer a história de cada um como um processo sensível e inacabado, não para ajustar ou comprovar conceitos. Sua obsessão pela cena da vida é similar à que tem pela arte, o que torna quase impossível, para ele, distinguir uma da outra, opor personagem a pessoa, contrapor fato a perspectiva do fato. Fazendo dessa obsessão um eixo de sua trajetória, Coutinho viveu como um homem/artista crítico para quem já existe arte encarnada no corpo e suspensa no espírito do outro: fixa a câmera, abre os olhos e os ouvidos, apresenta-se, mostra-se, mostra-o, mostra-nos.


                                                                                                         (Armindo Post, inédito



Ao se referir à recusa aos paradigmas que atropelam nossa visão de mundo, identificando-a como uma característica da arte de Eduardo Coutinho, o autor do texto enaltece a capacidade que tem esse cineasta de

  • A reproduzir os lugares-comuns e as fórmulas conhecidas, aderindo aos valores socialmente aceitos e dados por nós como irrefutáveis.
  • B rejeitar as perspectivas estereotipadas que, de forma intempestiva, condicionam nosso modo de enxergar as coisas.
  • C desviar-nos da tentação de embaralhar a compreensão que temos da vida, quando ele simplifica e enrijece os valores pelos quais devemos nos guiar.
  • D dissipar os valores éticos, substituindo-os por critérios pessoais capazes de nos tornar mais determinados em nossas iniciativas.
  • E evitar decididamente os parâmetros estranhos aos códigos sociais já firmados, para que não nos enganemos na apreciação das coisas.