Questão 4 Comentada - Prefeitura de Brejo Santo-2 - Intérprete de Libras - CEV-URCA (2025)

Nudez

A filha tentava convencer a mãe a ir a praia e a velha resistia: estava muito idosa e gorda para vestir maiô.
— Mas, mamãe, eu já vi de maiô, na praia, muitas senhoras mais velhas e mais gordas do que você!
E a velha, suavemente:
— Eu tambem já vi. Por isso mesmo é que não vou.
Para mim, o critério dessa velha é o critério certo em matéria de nudez. O que é feio se esconde. Um moço, uma moça, no esplendor da juventude, seus belos corpos podem se mostrar praticamente desnudos, de biquíni, de sunga, de cavado: assim tão enxutos, rijos e tostados, chegam a ser castos. Predomina a impressão de beleza e saúde sobre a sugestão erótica. E, depois, sabe-se que aquela floração é tão transitória! Deixem que os jovens fruam o instante passageiro, que usem e mostrem os corpos na sua hora de flor, antes que chegue a hora da semente e do declínio.
Afirmam os nudistas, com perfeita lógica, que, todo o mundo andando nu, a nudez acostuma e deixa de escandalizar: Sim, acredito que num campo de nudistas se acabe vivendo com a mesma naturalidade que numa sala de família. Aliás, quem convive com índios sabe disso: o hábito torna a nudez invisível.
O que eu tenho contra os nudistas é a exibição obrigatória da feiura humana, o seu despojamento total, a miséria fisiológica sem um véu que a disfarce. O ridículo, a falta de dignidade de todo o mundo nu.
Certa amiga minha que, numa praia da Noruega, de repente se viu dentro de um grande bando de gente nua, diz que o seu choque primeiro não foi o da vergonha, foi o do grotesco. As pelancas, os babados, os rins flácidos, os joelhos grossos. A velhota magra com seus ossinhos de frango assado, a quarentona de busto murchinho, o senhor ruivo de barriga redonda, braços e canelas tão finos e peludos que, se tivesse mais duas pernas, seria igual a uma aranha. A matrona obesa e o seu esposo idem e o par de jovens rechonchudos, de mãos dadas como dois porquinhos enamorados. A seca donzela machona de coxas de cavalete, e a falsa Vênus de cintura grossa, com o falso atleta de torso enorme e pernas curtas. Da tribo toda, praticamente só se salvavam os adolescentes e as crianças.
A humanidade nua é feia, não há dúvida. E por isso mesmo a gente se oculta debaixo da roupa. Talvez mais do que para o defender do frio, a roupa se inventou para encobrir o corpo e lhe dar dignidade. O que é bonito se mostra, o que é feio se esconde, é a lei de todas as culturas humanas. Nada mais triste do que a deterioração do que foi belo. Ninguém usa no dedo um anel sem a pedra, ninguém bota na sala um ramo de flores murchas.

(Fonte: Rachel de Queiroz. As Menininhas e outras crônicas. RJ: J. Olympio, 1976.)


Observe o fragmento a seguir e marque a alternativa em que o texto não apresente ideias similares aos termos em destaque: “Deixem que os jovens fruam o instante passageiro, que usem e mostrem os corpos na sua hora de flor, antes que chegue a hora da semente e do declínio.”
  • A Que as tuas mãos na terra façam, com amor, / Da graça de teu corpo, esguia e nova, / Surgir à luz a haste de uma flor!...” (Florbela Espanca, "Nice.)
  • B “Oh, minh’alma, que creste em virtude! / O que será velhice e desalento, / Se isto se chama aurora e juventude?” (Antero de Quental, "Amaritudo)
  • C “A lenda pessoal é aquilo que você sempre desejou fazer. Todas as pessoas, no começo da juventude, sabem qual é sua lenda pessoal. Nesta altura da vida, tudo é claro, tudo é possível, e não temos medo de sonhar e de desejar tudo aquilo que gostaríamos de fazer.” (Paulo Coelho)
  • D “A serenidade e a vitalidade da nossa juventude baseiam - se em parte no fato de que nós, ao subirmos a montanha, não vermos a morte, pois ela encontra-se do outro lado da encosta.” (Arthur Schopenhauer).
  • E Da indiferença deste mundo, / onde o que se sente e se pensa / não tem eco, na ausência imensa. / Na ausência, areia movediça / onde se escreve igual sentença / para o que é vencido e o que vença. (Cecília Meireles)