Resumo de Direito da Criança e do Adolescente - Medidas Socioeducativas

Medidas Sócio-Educativas

No Capítulo IV do Título III, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) passa a tratar das medidas socioeducativas em espécie. Trata-se de rol taxativo, que prevê seis medidas, as quais, vale dizer, são aplicáveis somente aos adolescentes. Às crianças somente podem ser aplicadas medidas de proteção, as quais são aplicáveis tanto a crianças como a adolescentes.

As medidas socioeducativas são medidas jurídicas aplicáveis a adolescentes autores de atos infracionais, mediante procedimento adequado. Para que possam ser aplicadas, deve-se levar em conta, de acordo com o art. 112, § 1º, do ECA: (i) a capacidade de cumprir a medida; (ii) as circunstâncias; (iii) a gravidade da infração.

Além disso, os objetivos das medidas socioeducativas, de acordo com o art. 1º, § 2º da Lei nº 12.594/2012, são: (i) a responsabilização do adolescente quanto às consequências lesivas do ato infracional, sempre que possível incentivando a sua reparação; (ii) a integração social do adolescente, garantindo seus direitos individuais e sociais por meio do cumprimento de seu plano individual de atendimento; e (iii) a desaprovação da conduta infracional, efetivando as disposições da sentença como parâmetro máximo de privação de liberdade ou restrição de direitos.


Classificação

Segundo a doutrina, é possível classificar as medidas socioeducativas de acordo com os seguintes critérios: severidade, forma de cumprimento, duração e gerenciamento de medida.

  1. Quanto à severidade: segundo o critério da severidade, as medidas podem ser classificadas como de meio aberto, fechado ou semiaberto. As medidas de meio aberto são as medidas nas quais o adolescente permanece junto à comunidade. As de meio fechado, por sua vez, são as medidas em que o adolescente permanece institucionalizado. No entanto, nas medidas de meio semiaberto, haverá períodos em que o adolescente permanecerá institucionalizado, e outros em que permanecerá junto à família.
  2. Quanto à forma de cumprimento: de acordo com a forma de cumprimento, as medidas podem ser por tarefa ou por desempenho. As medidas cumpridas por tarefa são aquelas que se consideram cumpridas quando o adolescente desempenha determinada tarefa. Por outro lado, as medidas cumpridas por desempenho são as medidas nas quais há necessidade de suprimento de necessidades pedagógicas, como a liberdade assistida, sendo definida conforme o desempenho do adolescente.
  3. Quanto à duração: na classificação quanto à duração, as medidas podem ser de duração instantânea ou continuada. As medidas de duração instantânea são as que não se prolongam no tempo. Por sua vez, medidas de duração continuada serão as que se prolongam no tempo. Essas devem se dar em um tempo mínimo, que será determinado ou indeterminado, e um tempo máximo, que poderá ser legal ou judicial.
  4. Quanto ao gerenciamento da medida: segundo esse critério, as medidas socioeducativas podem ser divididas como de gerenciamento judicial, gerenciamento pelo Executivo municipal ou ainda de gerenciamento pelo Executivo estadual. As medidas de gerenciamento judicial serão gerenciadas pelo próprio Poder Judiciário, como é o caso da medida de obrigação de reparar o dano.

Por outro lado, as medidas de gerenciamento pelo Executivo municipal serão gerenciadas nesse âmbito, como é o caso da liberdade assistida e da prestação de serviços à comunidade. É possível ainda que as medidas sejam de gerenciamento pelo Executivo estadual, como a medida de internação e semiliberdade. Superada a classificação, passaremos à análise do rol de medidas.


Rol de medidas

As medidas socioeducativas passíveis de aplicação estão previstas no rol (taxativo) do art. 112 do ECA. São elas:

  1. Advertência: a primeira (e mais branda) medida socioeducativa prevista no rol do art. 112 é a medida de advertência, à qual é direcionada também a disposição do art. 115 do ECA: “Art. 115. A advertência consistirá em admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada”.

Essa medida, por ser mais branda, pode ser aplicada independentemente de prova cabal de autoria (art. 114, parágrafo único, do ECA), diferentemente das demais, que para serem aplicadas pressupõem provas suficientes de autoria e de materialidade da infração (obtidos na ação socioeducativa). Portanto, para a aplicação da medida de advertência, basta a comprovação da materialidade e que existam indícios suficientes de autoria, a qual não precisa estar cabalmente provada. Ademais, na medida de advertência, inexiste a necessidade de acompanhamento posterior do adolescente, pois trata-se de medida que se esgota em si mesma.

Outro aspecto da advertência é o fato de ser conduzida pelo juiz da Infância e Juventude, que deverá demonstrar para o adolescente que, apesar da baixa gravidade de sua conduta, terá efeitos jurídicos, podendo, por exemplo, ser um dos fatores que justifiquem futura internação. Vale ainda observar a necessidade de reduzir a termo a advertência. Trata-se de formalidade importante para registrar o ato judicial em questão, em razão de suas possíveis consequências futuras. No entanto, se a advertência se der em audiência, e constar da ata, desnecessário reduzi-la a termo.

b) Obrigação de reparar o dano: a segunda medida socioeducativa contida no art. 112 é a obrigação de reparar o dano. A finalidade dessa medida é compensar a vítima, por meio da restituição de bem, ressarcimento, ou outra forma a depender do caso. Temos ainda a disposição do art. 116 do ECA:

Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima.

Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada.

Para a aplicação dessa medida, é necessário existir prova da autoria e da materialidade da infração, não bastando a obtenção de indícios nesse caso.

Ademais, vale observar que, diferentemente das demais medidas, trata-se de medida gerenciada pelo próprio Poder Judiciário, uma vez que não é necessária intervenção de entidade de atendimento para executar a medida de obrigação de reparar o dano. Portanto, caberá ao Judiciário a fiscalização direta e indireta, para que se comprove a reparação. Assim que reparado o dano, extingue-se a medida. Em razão disso, é classificada como uma medida por tarefa (e não por desempenho).

Por fim, oportuno salientar que a obrigação de reparar o dano é imposta ao adolescente, e não aos pais ou responsáveis. No caso da responsabilidade civil, é dos pais a obrigação de reparar os danos causados pelos filhos (art. 932, inciso I, Código Civil – CC), mas não no caso de medidas socioeducativas. Consequentemente, para que seja aplicada essa medida, deve-se levar em conta a efetiva capacidade do adolescente de reparar o dano.

c) Prestação de serviços à comunidade: outra medida prevista no rol do art. 112 é a prestação de serviços à comunidade. Consiste na realização, pelo adolescente, de tarefas de interesse geral, de forma gratuita, observadas as suas aptidões e atendidas as regras do art. 117 do ECA:

Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais.

Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho.

Como se verifica na redação do parágrafo único do art. 117, existe um limite de jornada semanal máxima de oito horas, que poderá ser cumprida aos sábados, domingos, feriados ou dias úteis, desde que não prejudique a frequência escolar ou atividades profissionais desempenhadas pelo adolescente. A medida deve, contudo, ser cumprida em período não superior a seis meses.

Para a aplicação dessa medida, é necessário apurar a materialidade e autoria do ato infracional, mediante sentença, salvo no caso de cumulação com remissão, caso em que basta a concordância do adolescente e seu defensor. Essa apuração se dará em ação socioeducativa, observado o devido processo legal. Ademais, deve o juiz, quando da prolação da sentença, verificar a possibilidade física e mental do adolescente para a realização das tarefas.

Diferentemente das medidas já analisadas, a medida de prestação de serviços à comunidade demanda a abertura de processo de execução, com expedição de uma guia para tanto, a qual, em razão da alteração promovida no art. 198 do ECA, somente poderá ser expedida após o trânsito em julgado da sentença. Essa guia será a peça inaugural do processo de execução, que se processará perante a Vara da Infância e da Juventude.

Nessa medida, é ainda necessário o acompanhamento por entidade de atendimento responsável pela execução do respectivo programa, a qual deverá encaminhar relatórios para o juiz da Vara da Infância, comunicando acerca do cumprimento da medida. Quando cumprida no tempo fixado, deverá o juiz extinguir a medida. Contudo, no caso de não cumprimento, deverá o juiz promover a oitiva do adolescente acerca do descumprimento e, posteriormente, poderá modificar a medida por outra mais adequada. No caso do não cumprimento, é possível que seja inclusive aplicada a medida de internação-sanção (com prazo determinado).

d) Liberdade assistida: a medida socioeducativa da liberdade assistida, além de prevista no art. 112, é disciplinada pelos arts. 118 e 119 do ECA:

Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.

§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.

§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor.

Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:

I – promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social;

II – supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula;

III – diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho;

IV – apresentar relatório do caso.

Dentre as medidas em que não há privação de liberdade, a medida de liberdade assistida é a mais rígida. Isto porque nela o adolescente permanece junto à família e em convivência comunitária, mas, ao mesmo tempo, está sujeito a acompanhamento, auxílio e orientação.

Para que possa ser aplicada, é essencial a apuração da materialidade e autoria mediante procedimento que observe o devido processo legal. Ademais, é necessário o acompanhamento por entidade de atendimento, responsável pela execução da medida, que deverá realizar a remessa de relatórios.

A entidade será responsável pela indicação de pessoa orientadora para o caso, que deverá promover socialmente o adolescente e sua família, além de supervisionar a frequência e aproveitamento escolar do adolescente, bem como diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e sua inserção no mercado de trabalho. Deve ainda apresentar relatório da aplicação da medida, que deverá se dar no prazo mínimo de seis meses e máximo de três anos.

e) Semiliberdade: outra medida socioeducativa prevista no art. 112 é a semiliberdade, em que ocorre a restrição parcial da liberdade do adolescente, que estará afastado do convívio familiar e comunitário de origem, embora não se restrinja totalmente seu direito de ir e vir.

O art. 120 disciplina a semiliberdade:

Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial.

§ 1º São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade.

§ 2º A medida não comporta prazo determinado aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação.

Quando da aplicação dessa medida, o adolescente trabalha e estuda durante o dia e, no período noturno, fica recolhido em entidade de atendimento especializada. A medida será fixada sem prazo determinado, sendo o adolescente periodicamente avaliado a fim de verificar a possibilidade de mudança da medida aplicada, ou mesmo sua extinção. Embora não tenha prazo determinado, está limitada ao prazo legal máximo de três anos. Além disso, caso o adolescente complete 21 anos de idade, será dado termo à aplicação da medida.

Por tratar-se de medida restritiva de liberdade, deverá ser breve e excepcional, sobretudo por ser aplicada a pessoas em desenvolvimento. Ademais, somente pode ser aplicada por sentença na ação socioeducativa em que tenha sito apurada a materialidade e autoria.

Diferente das medidas anteriormente analisadas, a semiliberdade não pode ser aplicada em cumulação à remissão.

A medida será cumprida necessariamente em entidade de atendimento, que, pela aplicação do princípio da incompletude institucional, deverá utilizar-se de mecanismos de que dispõe, e também de mecanismos existentes na comunidade, de modo que não fique o adolescente adstrito aos mecanismos da instituição.

O desempenho de atividades externas, como estudo, trabalho e visitas à família, faz parte da essência da medida; não poderia ser restrito segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal – STF (HC nº 98.518/RJ, rel. Min. Eros Grau, j. 25.05.2010), em sentido contrário à atuação do Superior Tribunal de Justiça (STJ – (HC nº 62.293/RJ, rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 24.10.2006), que permitia tal restrição. Essa restrição, segundo o STF, somente poderia se dar em situações excepcionais, mediante fundamentação expressa e razoável.

f) Internação: trata-se da medida socioeducativa mais grave. Em razão de se tratar de medida privativa de liberdade, está sujeita aos princípios da brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento (art. 121, caput do ECA).

Da mesma forma que a medida de semiliberdade é fixada sem prazo determinado, havendo avaliação periódica do adolescente a cada seis meses a fim de determinar a necessidade de sua manutenção, tal prática é aplicada à medida de internação (art. 121, § 2º, do ECA). Contudo, diferentemente daquela medida, para que o adolescente possa participar de atividades externas durante a internação é necessária a autorização de equipe técnica da entidade, podendo essa autorização ser totalmente vedada pela autoridade judicial (art. 121, § 1º, do ECA).

Vale salientar que o juiz pode vedar a realização de atividades externas sem que, contudo, isso implique na incomunicabilidade do adolescente.

A internação será cumprida pelo adolescente dentro da entidade, sendo sua escolarização e profissionalização prestadas nesse âmbito. Vale ainda observar que a internação não pode ser cumulada com a remissão. Trata-se de medida extrema, aplicada em caso de atos infracionais que envolvam violência e grave ameaça, reiteração no cometimento de infrações graves ou descumprimento reiterado e injustificável de medida anterior.

Assim como no caso da medida de semiliberdade, deve ser observado o prazo legal máximo de três anos de internação (art. 121, §§ 3º e 4º, do ECA), contado o período de internação provisória. Ademais, aplica-se a liberação compulsória aos 21 anos de idade (art. 121, § 5º, do ECA). No entanto, em qualquer caso de desinternação, deve antes ser ouvido o Ministério Público e provida autorização judicial para tanto.

Três são as espécies de internação:

  1. Medida de internação provisória: trata-se da modalidade de internação decretada pelo juiz de Infância e Juventude durante o processo de conhecimento, ou seja, antes da sentença. Tem prazo limitado a 45 dias e está prevista no art. 108 do ECA.
  2. Medida de internação com prazo indeterminado: a internação com prazo indeterminado deve ser decretada pelo juiz da Infância e Juventude na sentença que encerra o processo de conhecimento. Tem prazo máximo de três anos. Trata-se da modalidade prevista no art. 122, incisos I e II, do ECA, com rol taxativo de hipóteses de cabimento.

Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:

I – tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; II – por reiteração no cometimento de outras infrações graves; (...)

Sua aplicação somente poderá se dar em sentença de processo que tenha garantido o devido processo legal e apuradas a materialidade e a autoria do ato infracional. Não pode, de acordo com a Súmula nº 342 do STJ, ser aplicada com fundamento exclusivo na confissão do adolescente.

As condições física e mental de o adolescente compreender o processo socioeducativo deve ser considerada quando da aplicação da medida. Ademais, só poderá ser aplicada de modo excepcional, ou seja, quando não existir outra medida adequada à ressocialização.

A gravidade do ato, por si só, não fundamenta a internação. Além disso, importante a redação da Súmula nº 492 do STJ: “o ato infracional análogo ao tráfico de drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente à imposição de medida socioeducativa de internação do adolescente”. Assim como já analisado em outras medidas, há nessa modalidade a expedição de guia de execução da medida, que dá início ao processo de execução, na qual o juiz acompanhará seu cumprimento.

c) Medida de internação com prazo determinado: também chamada internação-sanção, pressupõe a reiteração injustificada de descumprimento de medida socioeducativa imposta anteriormente (art. 122, inciso III, do ECA).

Da mesma forma que as demais modalidades de internação, não pode ser cumulada à remissão. Antes de ser decretada, é essencial a oitiva do adolescente, para que seja aferido o requisito de ser “injustificada” a reiteração do descumprimento, nos termos da Súmula nº 265 do STJ. Trata-se de uma forma de regressão. Essa medida será decretada pelo juízo da execução, cabível agravo de instrumento (AI) e HC dessa decretação. Seu prazo será limitado a três meses, não podendo ser convertida em internação com prazo indeterminado.