Vertentes literárias do estilo Barroco
Cultismo e conceptismo foram estilos literários do Barroco, Movimento da Literatura Brasileira que se iniciou nos anos 1600. Embora tenham se desenvolvido no mesmo período, cada um deles tinha uma linha de pensamento e características diferentes.
A corrente cultista, por exemplo, dá prioridade à construção de imagens, jogos de palavras, como sinonímia e antonímia, uso de figuras de linguagens, principalmente os paradoxos e metáforas, paralelismos, exploração dos sentidos.
A vertente conceptista, por sua vez, tem como característica a construção das ideias, o conteúdo intelectual das obras, também se utilizada de artifícios como a comparação e menção a outros textos, referências à natureza dos vocábulos, relações lógicas.
Embora apresentem aspectos diferentes, é possível encontrar particularidades concernentes ao cultismo e conceptismo em um único texto. Mas de um modo geral, eles se diferenciam em:
Cultismo – questionamento, responder à pergunta "como" das coisas;
Conceptismo – reflexão, busca pela essência das coisas.
Diferenças entre Cultismo e Conceptismo
Cultismo
Conhecido também como Gongorismo, por ter como principal representante o poeta espanhol Luís de Gôngora, o cultismo representava a realidade de forma indireta. Na linha de pensamento do cultismo, o mundo poderia ser descrito por meio das sensações.
Para isso, os autores cultistas exploravam as figuras de linguagem, como antítese, sinestesia, metáfora, as figuras de sintaxe para deixar a escrita com um estilo próprio, como o hipérbato, a anáfora, também eram comuns os trocadilhos.
Os autores que exploravam o cultismo gostavam muito de utilizar o jogo de palavras, que geralmente eram rebuscadas, termos eruditos. A habilidade dos artistas cultistas para desenvolver os textos contava muito. Observe um exemplo de poesia cultista:
Ao braço do Menino Jesus de Nossa Senhora das Maravilhas, A quem infiéis despedaçaramO todo sem a parte não é todo;A parte sem o todo não é parte;Mas se a parte o faz todo, sendo parte,Não se diga que é parte, sendo o todo.Em todo o sacramento está Deus todo,E todo assiste inteiro em qualquer parte,E feito em partes todo em toda a parte,Em qualquer parte sempre fica o todo.O braço de Jesus não seja parte,Pois que feito Jesus em partes todoAssiste cada parte em sua parte.Não se sabendo parte deste todo,Um braço, que lhe acharam, sendo parte,Nos disse as partes todas deste todo.(Gregório de Matos)
Fazendo uma análise do poema de Gregório de Matos dá para perceber algumas características como o uso de linguagem rebuscada, figuras de linguagem, jogo de palavras:
“Em todo o sacramento está Deus todo”, “Pois que feito Jesus em partes todo”, “Assiste cada parte em sua parte”.
Esse é também um poema repleto de religiosidade e o paradoxo, que é a união de duas coisas diferentes em um só pensamento, mesclando a vertente literária com o Barroco. Embora as palavras “partes e todo” representem coisas diferentes, podendo até causar uma certa confusão nos sentidos, dá para entender que “uma parte de Jesus é ele todo”.
Conceptismo
Na linha de pensamento conceptista, para obter o conhecimento era preciso fazer uma análise minuciosa do objeto, para assim, conhecer sua essência e definição. Por isso, os autores do conceptismo centram seus argumentos na razão, no raciocínio, na inteligência, sem utilizar os recursos sensoriais.
Diferente do que ocorria no cultismo, o estilo conceptista não usa de exuberâncias, mas é sempre conciso. Outros artifícios que estão sempre presentes na construção textual conceptista são o silogismo e o sofisma, tipos de raciocínios da lógica aristotélica.
O Silogismo é um tipo de raciocínio dedutivo que é formado por três proposições, ele é estruturado da seguinte forma: duas premissas formam uma terceira (conclusão), e elas estão interligadas pela lógica. Por exemplo:
“Todos os políticos são corruptos
Matheus é um político
Logo, Matheus é corrupto. “
Sofisma – o sofisma se difere do silogismo porque embora parta de premissas verdadeiras, elas são utilizadas para criar uma falsa ideia de verdade. O sofisma simula, propõe uma argumentação que parece ser verdade e cria um sistema que aparenta seguir as regras da lógica, mas na verdade leva a uma conclusão enganosa, incorreta.
Por exemplo:
“O amor é cego
Deus é amor
Logo, Deus é cego.”
Também conhecido por Quevedismo, por ter como um dos seus principais representantes o espanhol Quevedo, o conceptismo tem como objetivo convencer o leitor e ensiná-lo, por isso é muito utilizado na literatura Sacra e poesia religiosa.
Além de Quevedo, os Padres Antônio Vieira e Manuel Bernardes, além do poeta Gregório de Matos, também escreviam nesse estilo. Perceba que o texto conceptista tem: retórica, raciocínio lógico, frases bem organizadas seguindo uma ordem criteriosa. Observe com o exemplo da prosa abaixo:
Para um homem se ver a si mesmo são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelhos e olhos, e é de noite, não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister* olhos.(Pe. Antônio Vieira)
* A palavra mister quer dizer necessidade.
Outro exemplo:
Mui grande é o vosso amor e o meu delito;Porém pode ter fim todo o pecar,E não o vosso amor, que é infinito.Essa razão me obriga a confiarQue, por mais que pequei, neste conflitoEspero em vosso amor de me salvar.(Gregório de Matos)
Neste exemplo, dá para perceber o uso do raciocínio.
*Premissa maior: amor infinito de Crismo salva o pecador./ Premissa menor: sou pecador./ Conclusão: espero me salvar.
Vale ressaltar que ambos, Cultismo e Conceptismo não são estilos “fechados”. Os dois fizeram parte de uma mesma tendência e por isso os autores tinham facilidade para explorar os dois estilos, tanto em textos diferentes como em um mesmo texto.
Na verdade, pode-se observar que nem sempre a distinção entre cultismo e conceptismo é clara, pois é possível identificar algumas características semelhantes no texto, como a brincadeira com as palavras.