Texto para a questão.
A LUZ ALHEIA
Os insetos noturnos são atraídos pelo brilho artificial de uma lâmpada. Li, em algum lugar, que a Lua é uma fonte de orientação para eles e, vendo uma luz qualquer, ficam confusos e voam em espirais cada vez menores. O fototropismo instintivo tornase perigoso e até fatal. O brilho que seduz também queima. Como costumamos transferir consciência humana aos animais, questionamos: por que eles giram ao redor da cintilância que não os beneficia e pode até matá-los?
Humanos têm acentuado fototropismo. Buscamos a luz das pessoas. O interesse pelos famosos, em particular, é um tipo de busca do brilho alheio. Imagine estar próximo de alguém que, por algum motivo, você admira intensamente. Viramos insetos fascinados. Em si, a busca pela luminescência alheia é boa e até inspiradora. Crescemos quando olhamos para ídolos positivos e buscamos objetivos mais elevados. Porém, a sedução implica riscos.
Então, cada um de nós, insetos que voam sozinhos ou em grupo, vê uma luz coruscante na noite escura de nossa consciência. São biografias que, de longe, se mostram melhores, mais interessantes, desafiadoras e repletas de prazer. Elas estão no Facebook, no YouTube, no Instagram, nas revistas, nas narrativas dos amigos e na televisão. A luz alheia ilumina nossa mediocridade. Avaliamos o resultado visível, raramente o custo dele. Vemos alguém falar bem inglês, escrever bem, viajar muito, possuir boa aparência, ter uma família harmoniosa ou quaisquer outros pontos que nosso voo irregular captou na escuridão: ficamos ofuscados e atraídos, feridos narcisicamente e hipnotizados.
Machado de Assis usou esta metáfora no soneto “Círculo vicioso”. Um vaga-lume voa raso e, mirando ao alto, inveja uma estrela. A estrela lança seu olhar pesaroso em direção ao brilho da Lua. Nosso satélite natural inveja o Sol radiante. Por fim, no terceto final, o Astro-rei confessa: “Pesa-me esta brilhante auréola de nume.../Enfara-me esta luz e desmedida umbela.../Por que não nasci eu um simples vaga-lume?”. Fecha-se o círculo: desejamos o que não temos, a luz a mais ou a menos. O pirilampo, em seu gracioso voo, perde-se ao observar supostas felicidades mais elevadas. As estrelas são diminuídas pela Lua cheia e o Sol a todos se impõe com sua coroa radiosa. A inveja geral nem sequer concebe que o Sol brilhante possa ser infeliz.
Abrir mão da dor permanente da comparação e da projeção sobre a luz alheia é um desafio. Precisamos reaprender o caminho da máxima grega: conhece a ti mesmo. Isso não garante que cada vaga-lume se torne o Sol, todavia impede que ele se queime no equívoco da busca da luz alheia. Vaga-lume invejoso morre triste.
KARNAL, Leandro. Diálogo de culturas. 1.ed., 4ª reimpressão. – São Paulo: Contexto, 2018.Adaptado.
Atente-se aos vocábulos demarcados a seguir, a fim de assinalar a correta função que desempenham nos contextos em que se inserem.
I. “O brilho que seduz também queima.”
II. “Isso não garante que cada vaga-lume se torne o Sol”
- A Em I, há uma conjunção integrante e, em II, um pronome relativo.
- B Em I e em II, há pronomes relativos.
- C Em I e em II, há conjunções integrantes.
- D Em I, há um pronome relativo e, em II, uma conjunção integrante.