Texto 2
Na hora do lobo
Quando um homem consome a madrugada
rabiscando umas folhas de papel
e ele sabe que a vida é tonelada
oscilando na ponta de um cordel;
ele sabe que o fim de toda estrada
não desagua no inferno nem no céu,
e ele pensa na feira, na empregada,
água e luz, condomínio e aluguel;
Quando um homem fatiga a voz cansada
com palavras da Torre de Babel
e ele entende que a coisa mais amada
se transmuda na coisa mais cruel;
Quando a taça em que bebe está quebrada,
tanto vidro a boiar em tanto fel
e no peito uma dor desatinada
essa dor que é tão nítida e fiel;
Quando um homem de boca tão calada
sente a mente girar num carrossel,
ele escreve através da madrugada
com cuidados de abelha que faz mel:
sua vida, talvez, foi destinada
a salvar estas folhas de papel.
Braulio Tavares, O homem artificial
O poema “Na hora do lobo”, de Bráulio Tavares, apresenta uma construção lírica que:
- A Recria mitos clássicos para representar conflitos morais da sociedade contemporânea, retomando traços do arcadismo.
- B Recupera o formalismo poético parnasiano ao tratar a criação literária como objeto de arte pela arte.
- C Valoriza o engajamento político e a coletividade, refletindo a estética modernista da segunda geração.
- D Retrata a realidade objetiva com distanciamento emocional, como nos poemas científicos do concretismo.
- E Articula sofrimento íntimo, tensão cotidiana e a valorização do fazer poético, revelando a subjetividade característica da lírica contemporânea.