O outro marido
Era conferente da Alfândega — mas isso não tem importância. Somos todos alguma coisa fora de nós; o eu irredutível nada tem a ver com as classificações profissionais. Pouco importa que nos avaliem pela casca. Por dentro, sentia-se diferente, capaz de mudar sempre, enquanto a situação exterior e familiar não mudava. Nisso está o espinho do homem: ele muda, os outros não percebem.
Sua mulher não tinha percebido. Era a mesma de há 23 anos, quando se casaram (quanto ao íntimo, é claro). Por falta de filhos, os dois viveram demasiado perto um do outro, sem derivativo. Tão perto que se desconheciam mutuamente, como um objeto desconhece outro, na mesma prateleira de armário. Santos doía-se de ser um objeto aos olhos de d. Laurinha. Se ela também era um objeto aos olhos dele? Sim, mas com a diferença de que d. Laurinha não procurava fugir a essa simplificação, nem reparava; era de fato objeto. Ele, Santos, sentia-se vivo e desagradado.
Ao aparecerem nele as primeiras dores, d. Laurinha penalizou-se, mas esse interesse não beneficiou as relações do casal. Santos parecia comprazer-se em estar doente. Não propriamente em queixar-se, mas em alegar que ia mal. A doença era para ele ocupação, emprego suplementar. O médico da Alfândega dissera-lhe que certas formas reumáticas levam anos para ser dominadas, exigem adaptação e disciplina. Santos começou a cuidar do corpo como de uma planta delicada. E mostrou a d. Laurinha a nevoenta radiografia da coluna vertebral, com certo orgulho de estar assim tão afetado.
– Quando você ficar bom…
– Não vou ficar. Tenho doença para o resto da vida.
Para d. Laurinha, a melhor maneira de curar-se é tomar remédio e entregar o caso à alma do padre Eustáquio, que vela por nós. Começou a fatigar-se com a importância que o reumatismo assumira na vida do marido. E não se amolou muito quando ele anunciou que ia internar-se no Hospital Gaffrée Guinle.
– Você não sentirá falta de nada, assegurou-lhe Santos. Tirei licença com ordenado integral. Eu mesmo virei aqui todo começo de mês trazer o dinheiro.
(...) Pontualmente, Santos trazia-lhe o dinheiro da despesa, ficaram até um pouco amigos nessa breve conversa a longos intervalos. Ele chegava e saía curvado, sob a garra do reumatismo, que nem melhorava nem matava. A visita não era de todo desagradável, desde que a doença deixara de ser assunto. Ela notou como a vida de hospital pode ser distraída: os internados sabem de tudo cá de fora.
– Pelo rádio — explicou Santos. (...)
Santos veio um ano, dois, cinco. Certo dia não veio. D. Laurinha preocupou-se. Não só lhe faziam falta os cruzeiros; ele também fazia. Tomou o ônibus, foi ao hospital pela primeira vez, em alvoroço.
Lá ele não era conhecido. Na Alfândega informaram-lhe que Santos falecera havia quinze dias, a senhora quer o endereço da viúva?
– Sou eu a viúva — disse d. Laurinha, espantada.
O informante olhou-a com incredulidade. Conhecia muito bem a viúva do Santos, d. Crisália, fizera bons piqueniques com o casal na ilha do Governador. Santos fora seu parceiro de bilhar e de pescaria. Grande praça. Ele era padrinho do filho mais velho de Santos. Deixara três órfãos, coitado.
E tirou da carteira uma foto, um grupo de praia. Lá estavam Santos, muito lépido, sorrindo, a outra mulher, os três garotos. Não havia dúvida: era ele mesmo, seu marido. Contudo, a outra realidade de Santos era tão destacada da sua, que o tornava outro homem, completamente desconhecido, irreconhecível.
– Desculpe, foi engano. A pessoa a que me refiro não é essa — disse d. Laurinha, despedindo-se.
ANDRADE, Carlos Drummond. Disponível em: https://contobrasileiro.com.br/o-outromarido-cronica-de-carlos-drummond-deandrade/ (Adaptado)
Quanto à flexão verbal, assinale a alternativa que apresenta uma passagem do texto, retirada do 8º parágrafo, com verbo no pretérito maisque-perfeito do modo indicativo:
O outro marido
Era conferente da Alfândega — mas isso não tem importância. Somos todos alguma coisa fora de nós; o eu irredutível nada tem a ver com as classificações profissionais. Pouco importa que nos avaliem pela casca. Por dentro, sentia-se diferente, capaz de mudar sempre, enquanto a situação exterior e familiar não mudava. Nisso está o espinho do homem: ele muda, os outros não percebem.
Sua mulher não tinha percebido. Era a mesma de há 23 anos, quando se casaram (quanto ao íntimo, é claro). Por falta de filhos, os dois viveram demasiado perto um do outro, sem derivativo. Tão perto que se desconheciam mutuamente, como um objeto desconhece outro, na mesma prateleira de armário. Santos doía-se de ser um objeto aos olhos de d. Laurinha. Se ela também era um objeto aos olhos dele? Sim, mas com a diferença de que d. Laurinha não procurava fugir a essa simplificação, nem reparava; era de fato objeto. Ele, Santos, sentia-se vivo e desagradado.
Ao aparecerem nele as primeiras dores, d. Laurinha penalizou-se, mas esse interesse não beneficiou as relações do casal. Santos parecia comprazer-se em estar doente. Não propriamente em queixar-se, mas em alegar que ia mal. A doença era para ele ocupação, emprego suplementar. O médico da Alfândega dissera-lhe que certas formas reumáticas levam anos para ser dominadas, exigem adaptação e disciplina. Santos começou a cuidar do corpo como de uma planta delicada. E mostrou a d. Laurinha a nevoenta radiografia da coluna vertebral, com certo orgulho de estar assim tão afetado.
– Quando você ficar bom…
– Não vou ficar. Tenho doença para o resto da vida.
Para d. Laurinha, a melhor maneira de curar-se é tomar remédio e entregar o caso à alma do padre Eustáquio, que vela por nós. Começou a fatigar-se com a importância que o reumatismo assumira na vida do marido. E não se amolou muito quando ele anunciou que ia internar-se no Hospital Gaffrée Guinle.
– Você não sentirá falta de nada, assegurou-lhe Santos. Tirei licença com ordenado integral. Eu mesmo virei aqui todo começo de mês trazer o dinheiro.
(...) Pontualmente, Santos trazia-lhe o dinheiro da despesa, ficaram até um pouco amigos nessa breve conversa a longos intervalos. Ele chegava e saía curvado, sob a garra do reumatismo, que nem melhorava nem matava. A visita não era de todo desagradável, desde que a doença deixara de ser assunto. Ela notou como a vida de hospital pode ser distraída: os internados sabem de tudo cá de fora.
– Pelo rádio — explicou Santos. (...)
Santos veio um ano, dois, cinco. Certo dia não veio. D. Laurinha preocupou-se. Não só lhe faziam falta os cruzeiros; ele também fazia. Tomou o ônibus, foi ao hospital pela primeira vez, em alvoroço.
Lá ele não era conhecido. Na Alfândega informaram-lhe que Santos falecera havia quinze dias, a senhora quer o endereço da viúva?
– Sou eu a viúva — disse d. Laurinha, espantada.
O informante olhou-a com incredulidade. Conhecia muito bem a viúva do Santos, d. Crisália, fizera bons piqueniques com o casal na ilha do Governador. Santos fora seu parceiro de bilhar e de pescaria. Grande praça. Ele era padrinho do filho mais velho de Santos. Deixara três órfãos, coitado.
E tirou da carteira uma foto, um grupo de praia. Lá estavam Santos, muito lépido, sorrindo, a outra mulher, os três garotos. Não havia dúvida: era ele mesmo, seu marido. Contudo, a outra realidade de Santos era tão destacada da sua, que o tornava outro homem, completamente desconhecido, irreconhecível.
– Desculpe, foi engano. A pessoa a que me refiro não é essa — disse d. Laurinha, despedindo-se.
ANDRADE, Carlos Drummond. Disponível em: https://contobrasileiro.com.br/o-outromarido-cronica-de-carlos-drummond-deandrade/ (Adaptado)
Há um uso adequado do acento grave indicativo de crase apenas na opção:
O outro marido
Era conferente da Alfândega — mas isso não tem importância. Somos todos alguma coisa fora de nós; o eu irredutível nada tem a ver com as classificações profissionais. Pouco importa que nos avaliem pela casca. Por dentro, sentia-se diferente, capaz de mudar sempre, enquanto a situação exterior e familiar não mudava. Nisso está o espinho do homem: ele muda, os outros não percebem.
Sua mulher não tinha percebido. Era a mesma de há 23 anos, quando se casaram (quanto ao íntimo, é claro). Por falta de filhos, os dois viveram demasiado perto um do outro, sem derivativo. Tão perto que se desconheciam mutuamente, como um objeto desconhece outro, na mesma prateleira de armário. Santos doía-se de ser um objeto aos olhos de d. Laurinha. Se ela também era um objeto aos olhos dele? Sim, mas com a diferença de que d. Laurinha não procurava fugir a essa simplificação, nem reparava; era de fato objeto. Ele, Santos, sentia-se vivo e desagradado.
Ao aparecerem nele as primeiras dores, d. Laurinha penalizou-se, mas esse interesse não beneficiou as relações do casal. Santos parecia comprazer-se em estar doente. Não propriamente em queixar-se, mas em alegar que ia mal. A doença era para ele ocupação, emprego suplementar. O médico da Alfândega dissera-lhe que certas formas reumáticas levam anos para ser dominadas, exigem adaptação e disciplina. Santos começou a cuidar do corpo como de uma planta delicada. E mostrou a d. Laurinha a nevoenta radiografia da coluna vertebral, com certo orgulho de estar assim tão afetado.
– Quando você ficar bom…
– Não vou ficar. Tenho doença para o resto da vida.
Para d. Laurinha, a melhor maneira de curar-se é tomar remédio e entregar o caso à alma do padre Eustáquio, que vela por nós. Começou a fatigar-se com a importância que o reumatismo assumira na vida do marido. E não se amolou muito quando ele anunciou que ia internar-se no Hospital Gaffrée Guinle.
– Você não sentirá falta de nada, assegurou-lhe Santos. Tirei licença com ordenado integral. Eu mesmo virei aqui todo começo de mês trazer o dinheiro.
(...) Pontualmente, Santos trazia-lhe o dinheiro da despesa, ficaram até um pouco amigos nessa breve conversa a longos intervalos. Ele chegava e saía curvado, sob a garra do reumatismo, que nem melhorava nem matava. A visita não era de todo desagradável, desde que a doença deixara de ser assunto. Ela notou como a vida de hospital pode ser distraída: os internados sabem de tudo cá de fora.
– Pelo rádio — explicou Santos. (...)
Santos veio um ano, dois, cinco. Certo dia não veio. D. Laurinha preocupou-se. Não só lhe faziam falta os cruzeiros; ele também fazia. Tomou o ônibus, foi ao hospital pela primeira vez, em alvoroço.
Lá ele não era conhecido. Na Alfândega informaram-lhe que Santos falecera havia quinze dias, a senhora quer o endereço da viúva?
– Sou eu a viúva — disse d. Laurinha, espantada.
O informante olhou-a com incredulidade. Conhecia muito bem a viúva do Santos, d. Crisália, fizera bons piqueniques com o casal na ilha do Governador. Santos fora seu parceiro de bilhar e de pescaria. Grande praça. Ele era padrinho do filho mais velho de Santos. Deixara três órfãos, coitado.
E tirou da carteira uma foto, um grupo de praia. Lá estavam Santos, muito lépido, sorrindo, a outra mulher, os três garotos. Não havia dúvida: era ele mesmo, seu marido. Contudo, a outra realidade de Santos era tão destacada da sua, que o tornava outro homem, completamente desconhecido, irreconhecível.
– Desculpe, foi engano. A pessoa a que me refiro não é essa — disse d. Laurinha, despedindo-se.
ANDRADE, Carlos Drummond. Disponível em: https://contobrasileiro.com.br/o-outromarido-cronica-de-carlos-drummond-deandrade/ (Adaptado)
O vocábulo corretamente grafado está presente na alternativa:
A frase abaixo que mostra uma forma inadequada do termo sublinhado é:
No texto, o sinal indicativo da crase poderia ser empregado no termo destacado em:
Aos poetas clássicos
Patativa do Assaré
Poetas niversitário,
Poetas de Cadenia,
De rico vocabulário
Cheio de mitologia,
Se a gente canta o que pensa,
Eu quero pedir licença.
Pois mesmo sem português
Neste livrinho apresento
O prazê e o sofrimento
De um poeta camponês
Disponível em <https//www.jornaldepoesia.jor.br/antonio3html> Acesso em 03 mai 2023
Na sequência "Poetas niversitário/Poetas de Cademia", o uso da vírgula separa dois elementos linguisticos de mesma natureza sintática, qual seja,
Considerando-se as palavras “foco”, “apreender”, “atrair”, “assimilar” e “suscitar”, quantas são classificadas como trissílabas (três sílabas)?
Considerando-se a combinação entre tempos e modos, a frase que atende à norma-padrão é:
Nas correspondências oficiais, o cargo e a função ocupados pelo destinatário determinará o pronome de tratamento a ser empregado.
A adequada correlação entre o cargo e o pronome de tratamento está estabelecida em:
Leia atentamente o texto abaixo e responda a questão proposta.
MEU MELHOR CONTO
Moacyr Scliar
Você me pergunta qual foi o melhor conto que escrevi. Indagação típica de jovens jornalistas; vocês vêm aqui, com esses pequenos gravadores, que sempre dão problema, e uma lista de perguntas - e aí querem saber qual foi o melhor ponto que a gente fez, qual provocou maior controvérsia, essas coisas. Mas tudo bem: não vou me furtar a responder essa questão. Dá mais trabalho explicar por que a gente não responde do que simplesmente responder.
Meu melhor conto... Não está em nenhum dos meus livros, em nenhuma antologia, em nenhuma publicação. Ele está aqui, na minha memória; posso acessá-lo a qualquer momento. Posso inclusive lembrar as circunstâncias em que o escrevi. Não esqueci, não. Não esqueci nada. Mesmo que quisesse esquecer, não o conseguiria.
Eu era então um jovem escritor - faz muito tempo, portanto, que isso aconteceu. Estava concluindo o curso de Letras e acabara de publicar meu primeiro livro, recebido com muito entusiasmo pelos críticos. É uma revelação, diziam todos, e eu, que à época nada tinha de modesto, concordava inteiramente: considerava-me um gênio. Um génio contestador. Minhas histórias estavam impregnadas de indignação; eram verdadeiros panfletos de protesto contra a injustiça social. O que me salvava do lugar-comum era a imaginação - a imaginação sem limites que é a marca registrada da juventude literária e que, como os cabelos, desaparecem com os anos.
Mas eu não era só escritor. Era militante político. Fazia parte de um minúsculo, obscuro, mas extremado grupo de universitários. Veio o golpe de 1964, participei em manifestações de protesto, cheguei a pensar em juntar-me à guerrilha - o que certamente seria um-desastre, porque eu era um garoto de classe média, mimado pelos pais, acostumado ao conforto, enfim, uma antípoda do guerrilheiro. De qualquer modo, fui preso.
Uma tragédia. Meus pais quase enlouqueceram. Fizeram o possível para me soltar, falaram com Deus e todo mundo, com políticos, jornalistas e até generais. Inútil. O momento era de linha dura, linha duríssima, e eu estava em mais de uma lista de suspeitos. Não me soltariam de jeito nenhum.
Fui levado para um lugar conhecido como Usina Pequena. Havia duas razões para essa denominação. Primeiro, o centro de detenção ficava, de fato, perto de uma termelétrica. Em segundo lugar, o método preferido para a tortura era, ali, o choque elétrico.
O chefe da Usina Pequena era o Tenente Jaguar. Esse não era o seu verdadeiro nome, mas o apelido era mais que o apropriado: ele tinha mesmo cara de felino, e de felino muito feroz. Ao sorrir, mostrava os caninos enormes - e isso era suficiente para dar calafrios nos prisioneiros.
Fiquei pouco tempo na Usina Pequena, quinze dias. Mas foi o suficiente. Da cela que eu ocupava, um cubículo escuro, úmido, fétido, eu ouvia os gritos dos prisioneiros sendo torturados e entrava em pânico, perguntando-me quando chegaria a minha vez. E aí uma manhã eles vieram me buscar e levaram-me para a chamada Sala do Gerador, o lugar das torturas, e ali estava o Tenente Jaguar, à minha espera, fumando uma cigarrilha e exibindo aquele sorriso sinistro. Leu meu prontuário e começou o interrogatório. Queria saber o paradeiro de um dos meus professores, suspeito de ser um líder importante na guerrilha.
Tão apavorado eu estava que teria falado - se soubesse, mesmo, onde estava o homem. Mas eu não sabia e foi o que respondi, numa voz trémula, que não sabia. Ele me olhou e estava claramente decidindo se eu falava a verdade ou se era bom ator. Mas ali a regra era: na dúvida, a tortura. E eu fui torturado. Choques nos genitais, o método clássico. No quarto choque, desmaiei, e me levaram de volta para a cela.
Durante dois dias ali fiquei, deitado no chão, encolhido, apavorado. No terceiro dia o carcereiro entrou na sala: o Tenente queria me ver. Implorei para que não me levasse: eu não aguento isso, vou morrer, e vocês vão se meter em confusão. Ignorando minhas súplicas, arrastou-me pelo corredor, mas não me levou para o lugar das torturas, e sim para a sala do Tenente. O que foi uma surpresa. Uma surpresa que aumentou quando o homem me recebeu gentilmente, pediu que sentasse, ofereceu-me um chá. Perguntou se eu tinha me recuperado dos choques; e aí - eu cada vez mais atônito - pediu desculpas: eu tinha de compreender que torturar era a função dele, e que precisava cumprir ordens.
Ficou um instante olhando pela janela - era uma bela manhã de primavera - e depois voltou-se para mim, anunciando que tinha um pedido a me fazer.
Àquela altura eu não entendia mais nada. Ele tinha um pedido a me fazer? O todo-poderoso chefe daquele lugar? O cara que podia me liquidar sem qualquer explicação tinha um pedido? Estou às suas ordens, eu disse, numa voz sumida, e ele foi adiante. Eu sei que você é escritor, e um escritor muito elogiado.
Está na sua ficha - acrescentou, sorridente. - Nós aqui temos todas as informações sobre sua vida.
Olhou-me de novo e acrescentou:
- Tem uma coisa que eu queria lhe mostrar.
Abriu uma gaveta e tirou de lá um recorte de jornal. Era uma notícia sobre um concurso de contos. Cada vez mais surpreso, li aquilo e mirei-o sem entender. Ele explicou.
Eu escrevo. Contos, como você. Mas tenho de admitir: não tenho um décimo do seu talento. Nova pausa, e continuou:
Quero ganhar esse concurso literário. Melhor, preciso ganhar esse concurso literário. Não me pergunte a razão, mas é muito importante para mim. E você vai me ajudar. Vai escrever um conto para mim. Posso contar com você, não é?
E então aconteceu a coisa mais surpreendente. Eu disse que não, que não escreveria merda nenhuma para ele.
Tão logo falei, dei-me conta do que tinha feito - e fiquei a um tempo aterrorizado e orgulhoso. Sim, eu tinha ousado resistir. Sim, eu tinha mostrado a minha fibra de revolucionário. Mas, e agora? E os choques?
Para meu espanto, o homem começou a chorar. Chorava desabaladamente, como uma criança. E então me explicou: quem tinha mandado aquele recorte fora o seu filho, um rapaz de catorze anos que adorava o pai, e adorava as histórias que o pai escrevia
- Ele quer que eu ganhe o concurso, o meu filho o Tenente, soluçando. E eu quero ganhar o concurso. Para ele. É um rapaz muito doente, talvez não viva muito. Eu preciso lhe dar essa alegria. E só você pode me ajudar.
Olhava-me, as lágrimas escorrendo pela face.
O que podia eu dizer? Pedi que me arranjasse uma máquina de escrever e umas folhas de papel.
Naquela tarde mesmo escrevi o conto. Nem precisei pensar muito; simplesmente sentei e fui escrevendo. A história brotava de dentro de mim, fluía fácil. E era um belo conto, diferente de tudo o que eu tinha escrito até então. Não falava em revolta, não satirizava opressores. Contava a história de um pai e de seu filho moribundo.
Entreguei o conto ao Tenente, que o recebeu sem dizer palavra, sem sequer me olhar. E no dia seguinte fui solto.
Nunca fiquei sabendo o que aconteceu depois, o resultado do concurso, nada disso. Não estava interessado; ao contrário, queria esquecer a história toda, e inclusive o conto que eu tinha escrito. O que foi inútil. A narrativa continuava dentro de mim, como continua até hoje. Se eu quisesse, poderia escrevê-la de uma sentada.
Mas não o farei. Esse conto não me pertence. É, acho, a melhor coisa que escrevi, mas não me pertence. Pertence ao Tenente, que esses dias, aliás, vi na rua: um ancião alquebrado, que anda apoiado numa bengala.
Ele me olhou e sorriu. Talvez tivesse, com gratidão, lembrado aquele episódio. Ou talvez estivesse debochando de mim. Com esses velhos torturadores, a gente nunca sabe.
(Porto Alegre, 2003.)
Conto de Moacyr Scliar publicado no livro "Do conto à crônica".
A confecção de um esfregaço sanguíneo exige prática do profissional para que seja adequado para a análise. Com relação ao tema, classifique as opções em verdadeiras (V) ou falsas (F).
I. A camada de sangue tem indicação de não atinja as margens da lâmina para evitar uma distribuição desigual das células de acordo com o tamanho;
II. A variação do ângulo entre as duas lâminas, a pressão sobre a lâmina, a extensão do esfregaço e o tamanho da gota de sangue são parâmetros que não interferem na espessura do esfregaço;
III. O esfregaço ideal deve ser fino, homogêneo e de margens livres para garantir distribuição homogênea dos componentes do sangue e ausência de alterações pela técnica nos leucócitos e eritrócitos;
IV. A confecção de um esfregaço satisfatório em caso de amostras de pacientes com anemia intensa é difícil porque o maior volume de plasma dificulta a secagem e facilita o aparecimento de artefatos;
V. Para a confecção do esfregaço, as lâminas devem estar isentas de gordura e, para isso, podem ser imersas em solução sulfocrômica, lavadas com água e sabão e imersas em álcool a 95%. Devem ser secas e, antes de usá-las, deve-se passar as lâminas por uma chama.
Marque a opção CORRETA.
Com relação ao microscópio óptico, utilizado diariamente na rotina laboratorial, classifique as opções em verdadeiras (V) ou falsas (F).
I. O ajuste do botão macrométrico permite a focalização das células ou tecido através da realização de pequenos movimentos verticais (ajustes finos);
II. O Charriot permite realizar o movimento da lâmina sobre a platina e ajustes finos no foco;
III. Para deslocar o microscópio de um local para outro, alguns manuais recomendam segurar pela base e pela parte posterior do braço;
IV. Durante a focalização, o ajuste na altura do condensador e o ajuste do diafragma não podem ser realizados simultaneamente;
V. A focalização deve ser realizada mudando as objetivas, da mais potente (100x) para a mais fraca (10x).
Marque a opção CORRETA.
Com relação à câmara de Neubauer, um hemocitômetro, marque a opção INCORRETA.
Para a análise adequada de um esfregaço do sangue periférico é preciso que o analista visualize todos os elementos do sangue. Com relação ao tema, classifique as opções em verdadeiras (V) ou falsas (F).
I. A eosina é um exemplo de corante ácido que promove a coloração rosa observada em algumas estruturas do sangue;
II. Os kits comerciais do método de Coloração Panótico Rápido recomendam realizar 20 imersões de 3 segundos da lâmina em cada solução;
III. As estruturas que absorvem ou incorporam os corantes ácidos são denominadas acidofílicas ou eosinofílicas ou neutrofílicas;
IV. Os componentes básicos da tiazina consistem em azul de metileno e seus análogos;
V. No sangue, o núcleo das células é corado pelos corantes básicos e, por isso, são chamados de basofílicos.
Marque a opção CORRETA.
Os reticulócitos são eritrócitos jovens originados na medula óssea. Com relação à contagem dos reticulócitos, marque a opção CORRETA.
Durante a utilização do microscópio óptico, podem surgir alguns problemas que impossibilitam a focalização adequada da lâmina e, portanto, a visualização da amostra. Com relação ao tema, classifique as opções em verdadeiras (V) ou falsas (F):
I. Quando o campo de visão não apresentar iluminação por igual, deve-se verificar se o revolver porta-objetivas não está engatado adequadamente;
II. Quando o campo de visão de um olho não corresponde ao do outro olho, a distância interpupilar está incorreta;
III. A limpeza das lentes sujas com manchas de óleo pode ser realizada com gaze ligeiramente embebida em álcool a 46%;
IV. Quando for utilizar a objetiva de 100x, recomenda-se que óleo de imersão seja aplicado na lâmina ainda na objetiva de 10%;
V. A alavanca de pré-focagem, que fica próxima aos botões macrométrico e micrométrico, garante que a objetiva não entre em contato com a amostra.
Marque a opção CORRETA.
A coloração de GRAM permite a classificação das bactérias em gram-positivas e gram-negativas. Alguns corantes e reagentes utilizados na coloração de GRAM estão listados abaixo, EXCETO:
Com relação aos problemas de coloração observados no esfregaço sanguíneo como, por exemplo, as colorações excessivamente azuis (basofilia excessiva) e rosas (eosinofilia excessiva), classifique os itens em Verdadeiros (V) ou Falsos (F).
I. Resíduos de detergentes nas lâminas interferem na coloração do esfregaço sanguíneo;
II. Os kits comerciais panótico rápido recomendam manter as soluções bem fechadas para evitar a evaporação, mas não é necessário realizar a troca periódica das soluções presentes nos frascos para imersão das lâminas;
III. O pH da água utilizada na lavagem final da lâmina não interfere na coloração do esfregaço sanguíneo;
IV. Nos casos de acidofilia excessiva, os grânulos de eosinófilos são observados na cor vermelha brilhante cintilante;
V. A utilização de uma maior proporção de diluente em relação ao corante pode corrigir o problema da basofilia excessiva;
VI. A alcalinidade elevada do corante ou do diluente podem produzir basofilia excessiva;
VII. A realização da coloração por um menor período de tempo ou por um menor número de imersões poderá corrigir o problema da coloração excessivamente azul.
Marque a opção CORRETA.
Os testes de imunofluorescência como, por exemplo, a imunofenotipagem realizada em citometria de fluxo utilizam reagentes denominados fluorocromos. Com relação ao tema, classifique as opções em verdadeiras (V) ou falsas (F).
I. Os fluorocromos são moléculas reveladoras ou fluorescentes ligadas covalentemente a anticorpos ou a antígenos;
II. Os fluorocromos devem ser armazenados no congelador (freezer) a uma temperatura de -10 °C;
III. A ficoeritrina (PE) é uma proteína fluorescente bastante utilizada nas técnicas de imunofluorescência;
IV. Os fluorocromos são moléculas que absorvem luz em um comprimento de onda maior e baixa energia e emitem luz em um comprimento de onda menor e elevada energia;
V. Para testes em humanos, as moléculas fluorescentes podem ser ligadas a imunoglobulinas anti-humanas que foram produzidas em camundongos ou ratos, por exemplo.
Marque a opção CORRETA.
Com relação ao método citometria de fluxo, marque a opção CORRETA.
Com relação ao procedimento técnico para a extração de DNA, marque a opção CORRETA.
A Doença de Chagas é uma parasitose causada pelo protozoário Trypanossoma cruzi e as técnicas de imunoensaio também são utilizadas no diagnóstico laboratorial. Com relação ao tema, marque a opção INCORRETA.
Com relação aos resíduos gerados pelos serviços de saúde, marque a opção INCORRETA.
Com relação às amostras utilizadas em imunoensaios, classifique as opções em verdadeiras (V) ou falsas (F):
I. A amostra utilizada na técnica de imunofenotipagem de células sanguíneas é o soro ou o plasma.
II. Para os analitos que precisam ser mantidos sob refrigeração, a centrífuga deve ser refrigerada.
III. A centrifugação usualmente utilizada é entre 1.000-1500 x g por 10 a 15 minutos.
IV. Para a realização dos imunoensaios como ELISA, por exemplo, o anticoagulante EDTA não é indicado.
V. Alterações na temperatura e no tempo de centrifugação, assim como na velocidade de rotação podem causar hemólise da amostra.
VI. Para a maioria dos imunensaios, amostras lipêmicas, ictéricas, congeladas e descongeladas repetidamente não causam interferência.
Marque a opção CORRETA.
Com relação às vidrarias e outros materiais utilizados para a realização dos exames parasitológicos de fezes, marque a opção CORRETA.
Com relação aos procedimentos de coleta, fixação e coloração de amostras de citologia ginecológica (Papanicolau), classifique os itens em verdadeiros (V) ou falsos (F).
I. A espátula de Ayres apresenta circunvoluções, em ambas as extremidades, um lado permite a coleta da ectocérvice e endocérvice, e o outro lado a coleta das paredes vaginais;
II. Para realizar a fixação da amostra, faz-se a imersão da lâmina por 10 minutos em álcool etílico a 70%;
III. Orange G6 (OG-6) é um corante básico que apresenta afinidade por componentes básicos do citoplasma e queratina;
IV. EA-36 e EA-65 são soluções constituídas pelos corantes verde luz amarelado, pardo Bismarck e a eosina amarelada;
V. EA-36 e o EA-65 são corantes com formulações semelhantes, a diferença está apenas na concentração de verde luz amarelado;
VI. O álcool etílico absoluto, a 95% e a 70%, e o xilol são reagentes utilizados na coloração de Papanicolau;
VII. A hematoxilina de Harris ou Gill não é utilizada na coloração de Papanicolau, apenas o azul de metileno.
Marque a alternativa CORRETA.
O volume inadequado das amostras ou reagentes durante a realização de exames para diagnóstico ou pesquisa científica podem interferir nos resultados obtidos. Com relação às boas práticas em pipetagem, classifique os itens em verdadeiros (V) ou falsos (F):
I. A remoção da ponteira antes da aspiração completa e a soltura do botão (embolo) rapidamente são erros que podem acontecer durante a pipetagem;
II. A profundidade de imersão da ponteira muda de acordo com o volume aspirado pela pipeta e interfere no volume aspirado;
III. O pré-enxague da ponteira evita que o volume expelido seja um pouco maior do valor esperado;
IV. Na pipetagem reversa, deve-se pressionar a embolo até o primeiro estágio, imergir a ponteira no reagente ou amostra e liberar o embolo lentamente até a posição de repouso;
V. Para transferir o líquido, tanto na pipetagem direta quanto na reversa, deve-se colocar a ponta da ponteira em um ângulo de 10 a 45 graus contra a parede interna do recipiente;
VI. Na pipetagem direta, para transferir o líquido aspirado deve-se pressionar o embolo suavemente até o primeiro estágio;
VII. Durante a pipetagem das amostras, o ritmo da pipetagem entre uma amostra e a outra não interfere no volume desejado.
Marque a opção CORRETA.
São procedimentos técnicos, materiais, reagentes e equipamentos necessários para realizar a coloração de Ziehl-Neelsen, EXCETO:
O teste de sensibilidade a antimicrobianos (TSA), o antibiograma, determina a sensibilidade das bactérias aos antibióticos. Com relação ao tema, marque a opção INCORRETA.
Com relação ao exame parasitológico de fezes, marque a opção CORRETA.