Resumo de Direito Civil - Princípios do Direito de Família

Direito de Família

Princípio de proteção da dignidade da pessoa humana

CF, Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III - a dignidade da pessoa humana;

 

Enuncia o art. 1.º, III, da CF/1988 que o nosso Estado Democrático de Direito tem como fundamento a dignidade da pessoa humana. Trata-se daquilo que se denomina princípio máximo, ou superprincípio, ou macro-princípio, ou princípio dos princípios. Diante desse regramento inafastável de proteção da pessoa humana é que está em voga, atualmente, falar empersonalizaçãorepersonalização e despatrimonialização do Direito Privado.

Por certo que é difícil a concretização exata do que seja o princípio da dignidade da pessoa humana, por tratar-se de uma cláusula geral, de um conceito legal indeterminado, com variantes de interpretações.

Deve-se ter em mente de que não há ramo do Direito Privado em que a dignidade da pessoa humana tem maior ingerência ou atuação do que o Direito de Família, embora a família possa, por exemplo, constituir-se por uma só pessoa.

Como exemplo, pode ser citado o comum entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o imóvel em que reside pessoa solteira é bem de família, estando protegido pela impenhorabilidade constante da Lei 8.009/1990. 

Com isso, protege-se a própria dignidade humana (art. 1.º, III, da CF/1988) e o direito constitucional à moradia, direito social e fundamental (art. 6.º da CF/1988). O entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça acabou por gerar a edição da Súmula 364 daquele Tribunal superior, in verbis: “o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas”.

 

 

Princípio da solidariedade familiar

CF, Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

 

A solidariedade social é reconhecida como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil pelo art. 3.º, I, da CF/1988, no sentido de construir uma sociedade livre, justa e solidária. Por razões óbvias, esse princípio acaba repercutindo nas relações familiares, eis que a solidariedade deve existir nesses relacionamentos pessoais. 

 

A solidariedade familiar justifica, entre outros, o pagamento dos alimentos no caso da sua necessidade, nos termos do art. 1.694 do Código Civil.

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

 

A norma justifica, inclusive, que a solidariedade familiar mantem-se mesmo após o divórcio ou o rompimento de união estável, cofnorme recente julgado do Superior Tribunal de Justiça:

“Alimentos x união estável rompida anteriormente ao advento da Lei 8.971, de 29.12.1994. A união duradoura entre homem e mulher, com o propósito de estabelecer uma vida em comum, pode determinar a obrigação de prestar alimentos ao companheiro necessitado, uma vez que o dever de solidariedade não decorre exclusivamente do casamento, mas também da realidade do laço familiar. Precedente da Quarta turma” (STJ, REsp 102.819/RJ, Rel. Min. Barros Monteiro, 4.ª Turma, j. 23.11.1998, DJ12.04.1999, p. 154).

 

O que o julgado reconhece, é que normas de ordem pública podem retroagir, principalmente aquelas que visam à manutenção digna da pessoa humana, especialização da ideia de solidariedade patrimonial.

 

 

Princípio da igualdade entre filhos

CF, Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

 

CC, Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

 

Esses comandos legais regulamentam especificamente na ordem familiar a isonomia constitucional, ou igualdade em sentido amplo, constante do art. 5.º, caput, da CF/1988, um dos princípios do Direito Civil Constitucional (“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”).

Portanto, juridicamente, todos os filhos são iguais perante a lei, havidos ou não durante o casamento. Essa igualdade abrange também os filhos adotivos e aqueles havidos por inseminação artificial heteróloga (com material genético de terceiro).

Diante disso, não se pode mais utilizar asodiosas expressões filho adulterino ou filho incestuoso que são discriminatórias. Igualmente, não podem ser utilizadas, em hipótese alguma, as expressões filho espúrio ou filho bastardo, comuns em passado não tão remoto. 

Apenas para fins didáticos utiliza-se o termo filho havido fora do casamento, eis que, juridicamente, todos são iguais. Isso repercute tanto no campo patrimonial quanto no pessoal, não sendo admitida qualquer forma de distinção jurídica, sob as penas da lei. Trata-se, desse modo, na ótica familiar, da primeira e mais importante especialidade da isonomia constitucional.

 

 

Princípio da igualdade entre cônjuges e companheiro

CF, Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

 

CC,  Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.

 

Assim como há a igualdade entre filhos, como outra forma de especialização da isonomia constitucional a lei reconhece a igualdade entre homens e mulheres no que se refere à sociedade conjugal ou convivencial formada pelo casamento ou pela união estável.

Diante do reconhecimento dessa igualdade, como exemplo prático, o marido ou companheiro pode pleitear alimentos da mulher ou companheira, ou mesmo vice-versa. Além disso, um pode utilizar o nome do outro livremente, conforme convenção das partes (art. 1.565, § 1.º, do CC).

Na verdade, no tocante ao princípio da igualdade entre homens e mulheres, a grande dificuldade reside em saber até que ponto vai essa igualdade no plano fático e concreto. Outras oportunidades surgirão na presente obra para demonstrar essas controvérsias.

 

Princípio da igualdade na chefia familiar

CC, Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:

III - mútua assistência;

IV - sustento, guarda e educação dos filhos;

 

CC, Art. 1.631. Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.

CC, Art. 1.634.  Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:     

I - dirigir-lhes a criação e a educação;     

II - exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584;     

III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;     

IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;     

V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;     

VI - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;     

VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;     

VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição

 

CF, Art. 226, § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

CF, Art. 226, § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.


Como decorrência lógica do princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros, surge o princípio da igualdade na chefia familiar, que pode ser exercida tanto pelo homem quanto pela mulher em um regime democrático de colaboração, podendo inclusive os filhos opinar (conceito de família democrática). Substitui-se uma hierarquia por uma diarquia.

Assim sendo, pode-se utilizar a expressão despatriarcalização do Direito de Família, eis que a figura paterna não exerce o poder de dominação do passado. O regime é de companheirismo e de cooperação, não de hierarquia, desaparecendo a ditatorial figura do pai de família (pater familias), não podendo sequer se utilizar a expressão pátrio poder, substituída por poder familiar.

 

 

Princípio da não intervenção ou da liberdade

CC, Art. 1.513. É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família.

 

Trata-se de consagração do princípio da liberdade ou da não intervenção na ótica do Direito de Família. o princípio em questão mantém relação direta com o princípio da autonomia privada, que deve existir no âmbito do Direito de Família.

A autonomia privada é  pode ser conceituada como sendo o poder que a pessoa tem de regulamentar os próprios interesses.

Deve-se ter muito cuidado na sua leitura. Isso porque o real sentido do texto legal é que o Estado ou mesmo um ente privado não pode intervir coativamente nas relações de família. Porém, o Estado poderá incentivar o controle da natalidade e o planejamento familiar por meio de políticas públicas.

Também é pertinente apontar que esse princípio deve ser lido e ponderado perante outros princípios, como no caso do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.

 

Princípio do melhor interesse da criança e do adolescente

CF, Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

O art. 3.º do ECA determina que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Também complementando o que consta do Texto Maior, o art. 4.º do ECA enuncia que: “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária

No caso de dissolução da sociedade conjugal, eventual culpa dos cônjuges não influencia a guarda de filhos, devendo ser aplicado o princípio que busca a proteção integral ou o melhor interesse da criança na guarda compartilhada, previsa nos arts. 1.583 e seguintes do Código Civil.

 

Princípio da afetividade

Apesar de algumas críticas contundentes e de polêmicas levantadas por alguns juristas, não resta a menor dúvida de que a afetividade constitui um princípio jurídico aplicado ao âmbito familiar.

Dessa forma, apesar da falta de sua previsão expressa na legislação, percebe-se que a sensibilidade dos juristas é capaz de demonstrar que a afetividade é um princípio do nosso sistema.

Oo afeto equivale à interação entre as pessoas, e não necessariamente ao amor, que é apenas uma de suas facetas. O amor é o afeto positivo por excelência. Todavia, há também oódio, que constitui o lado negativo dessa fonte de energia do Direito de Família Contemporâneo.

 

Princípio da função social da família

A principal função da família e a sua característica de meio para a realização dos anseios e pretensões. Não é mais a família um fim em sim mesmo, mas, o meio social para a busca de satisfação na relação com o outro.

A título de exemplo, a socialidade pode servir para fundamentar o parentesco civil decorrente da paternidade socioafetiva. Pode servir também para a conclusão de que há outras entidades familiares, caso da união homoafetiva, conforme reconheceu o Supremo Tribunal Federal. Isso tudo porque a sociedade muda, a família se altera e o Direito deve acompanhar essas transformações.

 

 

Princípio da boa-fé objetiva

 A boa-fé objetiva representa uma evolução do conceito de boa-fé, que saiu do plano da mera intenção – boa-fé subjetiva –, para o plano da conduta de lealdade das partes.

A boa-fé objetiva é a exigência de comportamento leal das partes, portanto, plenamente aplicável ao Direito de Família.

São considerados deveres anexos, entre outros:

•   Dever de cuidado em relação à outra parte negocial;

•   Dever de respeito;

•   Dever de informar a outra parte sobre o conteúdo do negócio;

•   Dever de agir conforme a confiança depositada;

•   Dever de lealdade e probidade;

•   Dever de colaboração ou cooperação;

•   Dever de agir com honestidade;

•   Dever de agir conforme a razoabilidade, a equidade e a boa razão.