Questões de Fundamentos da História : Tempo, Memória e Cultura (História)

Limpar Busca

O escritor argentino Julio Cortázar (1914-1984) escreveu em O Jornal e suas metamorfoses:


Um senhor pega um bonde depois de comprar o jornal e pô-lo debaixo do braço. Meia hora depois, desce com o mesmo jornal debaixo do mesmo braço.

Mas já não é o mesmo jornal, agora é um monte de folhas impressas que o senhor abandona num banco de praça.

Mal fica sozinho na praça, o monte de folhas impressas se transforma outra vez em jornal, até que um rapaz o descobre, o lê, e o deixa transformado num monte de folhas impressas.

Mal fica sozinho no banco, o monte de folhas impressas se transforma outra vez em jornal, até que uma velha o encontra, o lê e o deixa transformado num monte de folhas impressas. Depois, leva-o para casa e no caminho aproveita-o para embrulhar um molho de acelga, que é para o que servem os jornais depois dessas excitantes metamorfoses.


CORTÁZAR, Julio. Histórias de Cronópios e de Famas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. p. 63.


Um professor leu com os seus alunos esse texto de Cortázar, o que fez com que toda a turma concluísse que, na escola básica, os documentos históricos

  • A necessitam ser preservados na sua finalidade original de produção, privilegiando a informação que se apresenta no texto escrito.
  • B precisam ser compreendidos como materiais produzidos pelas elites, o que exige um trabalho de questionamento sobre os seus usos.
  • C podem ser usados como obras culturais e sociais, o que implica na investigação das suas diferentes formas de uso por sujeitos dos mais diversos.
  • D devem ser transformados em fonte de pesquisa, uma vez que os jovens e adolescentes são formados para trabalhar com os mesmos métodos de um historiador.

O historiador italiano Alessandro Portelli, ao desenvolver uma pesquisa fundamentada na história oral, realizou uma entrevista com Alfredo Filipponi, antigo operário e secretário da resistência comunista contra o fascismo entre 1943 e 1944. A entrevista ocorreu em 1973, quando Filipponi já se encontrava muito doente e faleceu pouco tempo depois. No decorrer da entrevista ocorreu o seguinte diálogo:

Portelli: Durante a resistência, você pensava apenas na liberdade nacional ou desejava alguma coisa mais?
Filipponi: Pensavámos na libertação nacional do fascismo e, após isso tínhamos esperança de alcançar o socialismo, o qual ainda não havíamos atingido. Depois que a guerra terminou - Terni foi onze meses mais cedo do que o resto do país -, o camarada Palmiro Togliatti [secretário do Partido Comunista italiano no pós-guerra] convocou uma reunião com os líderes do Partido em todas as províncias da Itália. Togliatti fez um discurso e adiantou que haveria eleições e pediu o meu apoio para ganharmos a eleição. Houve aceitação ao discurso feito, mas eu levantei minha mão: “Camarada Togliatti, eu discordo”, porque, como Lenine disse: quando o tordo voa, é o momento de atirar nele. Hoje o tordo está voando: todos os chefes fascistas estão se escondendo ou fugindo, tanto em Terni como em qualquer outro lugar. Este é o momento: nós atacamos e construímos o socialismo. Togliatti colocou a sua moção e a minha em votação e a dele obteve quatro votos a mais do que a minha, e assim foi vencedora.
Adaptado de: PORTELLI, Alessandro. Sonhos Ucrônicos, Memória e Possíveis Mundos dos Trabalhadores. Projeto História, n. 10, São Paulo: Educ, 1993. p. 42-43.


Segundo Portelli, a confrontação entre Filliponi e Togliatti nunca aconteceu. Com base nos estudos atuais sobre a oralidade como fonte de pesquisa, essa constatação indica que a História Oral

  • A favorece a produção de mentiras históricas, estimulando a ideia de que, para narrar o passado histórico, qualquer um conta um fato da maneira que for lhe for conveniente.
  • B oferece a possibilidade de versões imaginárias sobre um evento, apontando que os fatos poderiam ter sido diferentes se outros caminhos tivessem sido escolhidos.
  • C precisa ser confrontada com outras fontes para a obtenção do conhecimento histórico, tendo em vista que a oralidade é sempre constituída por uma visão interessada do sujeito.
  • D tem sido questionada pela historiografia contemporânea se é um instrumento confiável para a reconstrução do fato, uma vez que o depoimento individual apresenta muitas subjetividades.

Na civilização ocidental, o século XIX caracterizou-se, entre muitos outros aspectos, pelo desenvolvimento do conceito de ciência, particularmente das denominadas ciências naturais. É nesse contexto que a produção do conhecimento histórico procura alcançar o status de ciência, desenvolvendo teorias e aperfeiçoando seus métodos. A partir daí e ao longo do século XX, a historiografia avança até chegar aos dias atuais, com reflexos significativos, na sala de aula, da educação básica ao nível superior. Considerando a trajetória da historiografia contemporânea, assinale a opção correta.

  • A Em larga medida, até meados do século passado, o ensino da história nos níveis que hoje compõem a educação básica apegava-se quase exclusivamente à memorização de datas e personagens considerados importantes.
  • B O surgimento da história como ciência no século XIX foi fortemente marcado pela influência do materialismo histórico de inspiração marxista.
  • C Em suas origens, a produção do conhecimento histórico estava subordinada ao estudo do fato tal como ele ocorreu, afastando-se do estudo dos grandes nomes e da cronologia.
  • D Entre as chamadas ciências humanas e sociais, a história foi pioneira; a sociologia, por exemplo, só se constituiu como ramo científico após as duas guerras mundiais do século XX.
  • E A ciência histórica surgiu para combater o positivismo, por não aceitar as premissas que sustentavam o pensamento positivista.

Relativamente às novas tecnologias de comunicação e informação no ensino de história, assinale a opção correta.

  • A Na atualidade, é adequado que o ensino de história, a exemplo da pesquisa histórica, utilize-se de fontes audiovisuais como cinema e televisão.
  • B A televisão, por ser um veículo voltado apenas para o entretenimento, não oferece qualquer tipo de suporte ao trabalho docente em sala de aula.
  • C Na produção cinematográfica, interessa ao historiador os documentários, afastando-se de qualquer obra ficcional, por sua absoluta subjetividade.
  • D Apesar de todos os avanços tecnológicos, ainda hoje prevalece a ideia, defendida pelos fundadores da historiografia, de que a história só se registra com documentos escritos, normalmente oficiais.
  • E Há consenso entre historiadores de que o uso da informática é prejudicial à pesquisa e ao ensino, por delimitá-la a determinado recorte temporal e dispersar a atenção dos alunos em sala de aula.

A respeito de memória, oralidade e cotidiano no ensino de história, assinale a opção correta.

  • A A história oral é uma modalidade ou técnica de produção historiográfica que, utilizando-se de pressupostos teóricos e de adequada metodologia, dá ao entrevistado a oportunidade de fazer da memória elemento a mais para se produzir conhecimento histórico.
  • B A maior dificuldade que a história oral encontra no Brasil é a rigidez curricular das escolas, o que impossibilita entrevistas com alunos, familiares e membros da comunidade.
  • C Por não estar sujeita a subjetividades de qualquer espécie, a memória familiar ou comunitária é a fiel depositária do passado, sem a qual não se produz conhecimento histórico.
  • D No ensino de história, o cotidiano e a vida de pessoas comuns podem ser abordados, mas sempre em caráter secundário em relação àquilo que o cânone da historiografia já registra.
  • E A questão de gênero diz respeito basicamente a uma história das mulheres, sendo objeto de estudo de pesquisadores e demais profissionais da história desde seus primórdios.